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A múmia que deixava pessoas em transe no Museu Nacional

Na década de 60, vários visitantes relataram ter visões ao tocar a múmia de princesa Kherima nas aulas de um professor de egiptologia.
A múmia que deixava pessoas em transe no Museu Nacional

Na noite de 2 de setembro, o Museu Nacional, na Zona Norte do Rio de Janeiro, ardeu em chamas. O fogo que surgiu por volta das 19h30 acabou com mais de 20 milhões de peças históricas e modelos de pesquisa. Dentre elas, estavam fósseis de dinossauros, mamíferos extintos, Luzia e, como poucos noticiaram, uma princesa mumificada do Egito que já foi confundida com Carmen Miranda e deixava muitas pessoas em transe nas salas do lugar.

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A confusão que envolveu cantora e múmia ocorreu no meio do século passado. Em 1955, após a morte da cantora nos EUA, centenas de pessoas foram ao Museu Nacional pensando que o corpo da artista estaria lá. O cadáver de Carmen de fato veio embalsamado para o Rio, porém, foi exposto no Palácio do Catete, a quilômetros dali. A hipótese mais aceita para a confusão foi que algum veículo noticiou o local errado e não houve tempo para corrigir a informação. Assim, em vez de homenagearem a intérprete de “O que é que a baiana tem?”, fãs velaram a múmia de uma princesa egípcia.

Cinco anos após o caso, o falecido professor Victor Staviarski, funcionário do museu e membro da sociedade de amigos do Museu Nacional, dava aulas sobre o Egito e a escrita hieroglífica na seção de egiptologia do lugar. Para chamar atenção da classe, ele lecionava ao som de Aida, de Giuseppe Verdi, e usava de atração a múmia com a presença de médiuns e sessões de hipnose coletiva. O fato foi registrado pelo extinto jornal carioca “A Noite” em 1961.

Capa do jornal “A Noite” do Rio de Janeiro. Edição 1572 do ano de 1961. Imagem: Printscreen.

Capa do jornal "A Noite do Rio de Janeiro. Edição 1572 do ano de 1961. Imagem: Printscreen.

O misticismo em torno da múmia começou quando uma das alunas de Staviarski disse, após tocar no corpo embalsamado, ter visto o passado da múmia. Segundo a estudante, ela era uma nobre princesa virgem da cidade de Tebas que foi assassinada. A estudante também informou ao professor de que seu verdadeiro nome era Kherima. Foi aí que a múmia, até então sem nome, ganhou nome de batismo.

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De acordo com curadores do Museu Nacional, cientistas descobriram que, de fato, ela era filha do governador da importante cidade do Egito Antigo na época. Segundo a Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca (Ensp) informou a BBC, ela tinha entre 18 e 20 anos e viveu durante a época do Período Romano no Egito.

A lenda diz que ela foi esfaqueada até a morte, mas não foram encontradas evidências nas pesquisas. O fato é que Kherima foi mumificada de um modo muito nobre. Ela se destacava por apresentar membros separadamente enfaixados e decorados sobre linho, um tipo de fibra que provém de uma planta. Está técnica dava a percepção completa sobre a forma do corpo de uma mulher que vivera no Egito antigo.

Durante a mumificação de Kherima, o cérebro e as vísceras foram retiradas e os dentes foram preservados. Os dedos das mãos e dos pés foram envolvidos e decorados com tiras de tecido tingido para dar a impressão de unhas pintadas. Só existem mais nove múmias deste tipo no mundo.

Pés da múmia Kherima

Os pés de Kherima. Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil

Foi então que há 200 anos atrás, o imperador do Brasil, Dom Pedro I, arrematou Kherima em um leilão, trazendo-a para o Museu Nacional do Rio de Janeiro em 1824. Iniciou, assim, a coleção de relíquias egípcias das Américas.

Só 133 anos depois, com as aulas de Staviarsky, que Kherima começou a se cercar de histórias misteriosas. Na sala em que ficava exposta, o professor permitia que seus alunos a tocassem. Assim, diz a lenda, teriam descoberto seu poder: ao tocar a múmia, a pessoa entraria em transe absoluto.

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Na Revista de Jacareí de 1976, a escritora Ludmila Saharovsky retrata uma de suas experiências com a múmia. Ao tocar sua cabeça embalsamada, Ludmila afirma que entrou em transe e se viu em uma sala branca com uma mulher jovem, de cabelos longos e uma túnica branca. “Chegando bem perto de mim, ela me olhou fundo nos olhos e disse: ‘Não se preocupe com as crianças. Estou cuidando de meus filhos e de você. Tudo vai dar certo. Não tema a água. A água é vida.’ Me abraçou, me deu um beijo na face e saiu pela porta lateral”, recorda.

Os curadores do acervo na época afirmaram ao O Globo que as histórias místicas só rondavam esta múmia. “Talvez seja porque sua aparência é mais humana”, disse ao jornal o curador e professor Antônio Brancaglion Jr.

Assista ao vídeo "Como a impressão 3D pode ajudar a reconstruir o acervo do Museu Nacional"

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