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A Bent-Con É uma Convenção de Quadrinhos Para Nerds Gays

Demônios vermelhos e hipermusculosos mostrando os paus, um cara vestido de Ciclope do X-Men chacoalhando o traseiro e zumbis com sêmen pingando dos pintos decrépitos.

A Liga da Justiça Gender Bent. Foto por Pat Loika.

Para mim, a coisa mais interessante na Bent-Con — a convenção de quadrinhos LGBT da área de Los Angeles — foi (sem surpresa) os pintos e as bundas. Havia pessoas desenhando demônios vermelhos e hipermusculosos mostrando os paus, um cara vestido de Ciclope do X-Men chacoalhando o traseiro, zumbis com sêmen pingando dos pintos decrépitos… Bom, você entendeu.

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A convenção ainda está nos seus primeiros anos. Sua missão é dar espaço para criadores e fãs de quadrinhos LGBT. A ideia se encaixa nas profundas sobreposições culturais entre as comunidades geek e queer, ambas mostradas aqui em toda sua glória frontal.

“Tem mais gente me fotografando do que fotografando as celebridades!”, disse um entre as centenas de registrados, um cara vestido de réptil. A fantasia era quase esotericamente específica — ele era o Sleestak do Elo Perdido — mas muita gente, inclusive eu, entendeu a referência. Havia pessoas vestidas de personagens de mangá com cabeça de lobo, gays do Game of Thrones e vilões das séries da internet do Joss Whedon. Era uma mistura de linguagem muito particular e detalhada com um espetáculo extravagante e hiper-real, destacado pelas paredes bege do centro de convenções. Em outras palavras, isso ecoava um tipo de cultura LGBT condensada: uma cultura que definhou em suas próprias pistas e comunicações escondidas nas épocas anteriores, e que cada vez mais se estabelece na politica alegremente exagerada da visibilidade.

AVISO: A próxima imagem é uma ilustração fantástica de um homem de gelo ejaculando na própria boca. Se você está no trabalho e seu chefe não gosta que você veja imagens assim, é melhor esperar até chegar em casa.

“The Iceman Cummeth”, por Jezza Smilez.

Mas o que eram todos aqueles pintos malignos? Sem falar nos livros sobre homens com cabeças de raposa transando, ou as pinturas do Capitão Kirk levantando a camisa para mostrar o tanquinho (o William Shatner provavelmente ia curtir).

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Seria fácil descartar toda a putaria, acho. Mas se tem uma coisa que convenções de quadrinhos nos ensinam é que toda inconsequência é, na verdade, muito importante. Não estou falando só de como os geeks supervalorizam os detalhes (tipo quando eles dizem coisas como: “Na edição 274 d'O Espetacular Homem-Aranha, por que a teia dele se dissolve depois de apenas quinze minutos e não em duas horas?”, ou qualquer coisa do tipo). Quer dizer, se tem uma coisa que os geeks entendem melhor do que a maioria das pessoas, é que temas da cultura pop têm influências sérias na vida cotidiana. É por isso que se discute como a Mulher-Maravilha influenciou o feminismo, como A Hora do Pesadelo Parte 2 é, na verdade, um dos primeiros filmes gays do mainstream e como o Super-Homem nos dá esperança de que pessoas privilegiadas por serem brancas vão usar esse privilégio para ajudar as outras.

Um grupo que entende isso tanto, se não melhor, que os geeks são as pessoas das comunidades LGBT cujas vidas são moldadas pela cultura pop. A representação da mídia das expectativas e demandas dos gêneros como sendo relações monogâmicas entre pessoas heterossexuais definiu a luta LGBT. O que estou dizendo é que, se há um monte de quadrinhos mostrando lobisomens com enormes ereções à venda numa convenção de quadrinhos queer, há uma razão pra isso.

O autor, à direita, com Eternidade, o Grande Universo Gay.

Sexo, claro, tem sido um aspecto essencial e definidor da cultura gay desde que as pessoas começaram a entender que existia uma “cultura gay”. Mas não está exatamente claro o motivo pelo qual as pessoas querem ver seus personagens fantásticos favoritos, incluindo os não humanos, trepando.

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“Quando era criança, tudo o que eu sabia é que eu queria abraçar o Freddy do Scooby-Doo”, disse Phil Jimenez, um dos mais conhecidos ilustradores de super-heróis do mundo, num dos painéis de discussão da Bent-Con. “Abraçá-lo bem, bem apertado.” Alguns estudiosos de quadrinhos sugerem que quanto menos detalhada é uma obra de arte, mais fácil é projetar nela e ter um relacionamento com ela. Em outras palavras, quanto menos perfeitamente humano o personagem parece, é mais fácil interagir imaginariamente com ele. Então, personagens de quadrinhos e desenhos animados, diferente de pessoas de verdade, podem fornecer um receptáculo mais simples para as fantasias sexuais da juventude LGBT.

Ou talvez seja uma questão de poder — super ou outro. Jimenez suspeita que, por causa da inter-relação entre sexo, gênero e poder, sexo é um tema natural para pessoas marginalizadas e a arte com as quais elas se envolvem.

“Uma vez, conheci uma mulher de Nova Jersey numa convenção de quadrinhos italiana. Ela era a musa de um artista italiano e estava vestida de bárbara. Como o Conan, só que com peitos e unhas enormes. Ela me disse que, quando era menina, todo mundo queria que ela fosse líder de torcida, menos ela.” Obcecada em ser mais poderosa do que uma mera líder de torcida, “ela fantasiava em ser uma bárbara”.

Luke e Leia gender-bent. Foto por Pat Loika.

Pessoas LGBT experimentam com frequência fantasias similares de ser alguém que se destaca por ser quem é, em vez de ter que esconder seu verdadeiro eu. Como uma das principais dinâmicas do sexo é a dinâmica do poder, os super-heróis, que, afinal de contas, são superpoderosos, são inevitavelmente sexualizados. E enquanto os quadrinhos mainstream ainda apresentam personagens femininas com peitões e bumbuns empinados, a iconografia da Bent-Con é decididamente falocêntrica. Mas como tudo é atado por poderes e fantasia, isso surge como masculino, não realmente como macho. Muitas das mulheres da convenção — incluindo algumas que se identificavam como lésbicas — se envolviam com a apresentação de pênis e bundas de forma natural.

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Na sala dos fornecedores, a Tom of Finland Foundation apresentava suas imagens icônicas de caras gigantes com protuberâncias do tamanho de anacondas. Alguns estandes depois, Anne Ishii mostrava o trabalho do artista de quadrinhos de bondage Gengorah Tagame, entre outros. Um dos objetivos dela é trazer a arte dos quadrinhos eróticos japoneses para o público norte-americano. Em qualquer outro lugar, poderia parecer estranho que uma mulher faça esse trabalho, mas não na Bent-Con. Seu estande não representava exatamente um trabalho de ficção científica, mas os desenhos são especulativos e fantásticos. O mundo desses homens gigantes em posições comprometedoras é um mundo de fantasia e sua presença numa convenção de quadrinhos não parece nem um pouco deslocada.

Enquanto o segundo dia da convenção chegava ao fim, começou o concurso de fantasias, e a sexualidade e o espetáculo do mundo geek me fez perceber o quanto da vida LGBT (incluindo a minha) é gasta fantasiando. Fantasiando sobre um mundo onde nos encaixamos, e também um mundo onde o drama de ser diferente é emocionante, não frustrante. E claro, fantasiando sobre sexo.

O concurso é divertido e hilário. Um Lex Luthor de collant verde desfila balançando seu pacote. Uma mulher vestida de Harley Quinn, a ajudante do Coringa, entra segurando um taco de basebol, que depois ela enfia dentro da calça. Deadpool (talvez um homem, talvez uma mulher — a fantasia é meio unissex) finge dar um tiro na cabeça. Uma Morte sexy sobe ao palco para escoltar ele ou ela de lá. Um homem vestido de preto usando um grande acessório de cabeça sobe ao palco. Há estrelas por toda sua roupa, que é muito colada, e que mesmo obscurecendo totalmente o rosto do participante, ainda é reveladora. Esse é Eternidade, o personagem que representa a encarnação de todo o universo dos quadrinhos da Marvel. Não é uma fantasia muito elaborada, mas foi a de que mais gostei. Na Bent-Con, o Universo todo é queer e fabuloso.

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@ConnerHabib

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