Os millennials estão transando?

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Os millennials estão transando?

Investigamos a questão.
Lia Kantrowitz
ilustração por Lia Kantrowitz

Esta matéria foi originalmente publicada na VICE US .

Além de matar cadeias de restaurantes e acabar com o estoque de café no mundo, millennials também acabam com a santidade do casamento e do compromisso — ou pelo menos é isso que algumas manchetes querem que a gente acredite. Matérias febris decretam que essa geração é viciada em Tinder, incapaz de se comprometer e profundamente avessa a rótulos dentro de relacionamentos: um "apocalipse romântico" ultracasual de oba-oba, como um repórter da Vanity Fair descreveu.

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Mas a narrativa de uma grande orgia abastecida pelo Tinder na esteira da Geração X não é realmente o caso. "Não é verdade que os millennials estão transando muito mais que todo mundo", explica Lisa Wade, professora de sociologia do Occidental College e autora de American Hookup, um relato imersivo e bem pesquisado da cultura sexual nos campi dos EUA.

Dados publicados recentemente nos Achives of Sexual Behaviors ecoam isso: "Millennials têm a atitude sexual mais permissiva do que qualquer outra geração, mas escolhem fazer sexo com menos parceiros do que a Geração X na mesma idade", escreveram os pesquisadores da San Diego State University — liderados pela professora de psicologia e autora Jean Twenge. E semana passada, o CDC divulgou uma nova pesquisa mostrando uma queda dramática na atividade sexual relatada entre adolescentes: 42% das mulheres e 44% dos homens, entre 15 e 19 anos, relataram fazer sexo, comparado com 51% das mulheres e 60% dos homens no mesmo grupo de idade em 1988.

Isso parece contraintuitivo, considerando que a atitude sobre sexo pré-marital é estatisticamente mais relaxada e tolerante do que nunca — sem mencionar a facilidade com que as pessoas podem procurar e se envolver em sexo casual, graças aos aplicativos de encontro (cujo uso quase triplicou entre pessoas de 18 a 24 anos desde 2013, segundo o Pew Research Center). Ainda assim, entender se os millennials estão transando mais ou menos que as gerações anteriores é algo difícil de cravar com certeza, mesmo para sociólogos.

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A verdade parece estar em algum lugar no meio. Os níveis de promiscuidade não parecem ter mudado, e segundo algumas medições, pode ter caído. Tinder e outros aplicativos de encontro não mataram os relacionamentos ou criaram uma nova era de ouro para a promiscuidade sexual. Mas isso não significa que os millennials estão se envolvendo do mesmo jeito que seus pais faziam.

"O que definitivamente mudou foi o enquadramento da atividade sexual", diz Wade. Ela explica que para as últimas gerações, duas pessoas que saem juntas representam um relacionamento romântico. Claro, nem sempre era o caso. Mas essa era a suposição, ou pelo menos a mentira aceitável.

Mas agora, esse pano de fundo mudou, porque "só sexo" é uma alternativa socialmente aceitável no lugar de "Estou procurando um parceiro para o resto da vida". Como resultado, o modo como escolhemos interagir e nos comunicar mudou. De repente, todo mundo está trabalhando com diferentes roteiros, ou modelos de interação e comportamento. "O roteiro de 'só sexo' é tão presente que os millennials têm dificuldade em saber qual roteiro usar com determinada pessoa, qual roteiro a outra pessoa está usando, e quando a mesa pode virar", diz Wade. "Uma das minhas estudantes disse que se sentia sem chão. A coisa só ficou mais confusa."

Nesse ambiente, diz Wade, a opção social segura é seguir o roteiro de "só sexo", porque isso pelo menos protege você e seu ego — você não "parece desesperado", ou seja, querendo mais do que a outra parte está disposta a dar. "Então, com todo mundo usando por padrão o roteiro do 'só sexo', ou pronto para passar para o roteiro do 'só sexo' para negar vulnerabilidade, isso não é muito recompensador, porque exige que as pessoas finjam que não se importam com ninguém", ela diz. "As pessoas podem se importar e querer um romance, ou não, mas todo mundo está meio que precisando fingir um desinteresse."

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Esse cenário de desinteresse fingido como camuflagem emocional parece bem deprê. E ainda assim, apesar de todo o choque com os millennials se desviando de casamento e compromisso, os números mostram que os jovens muitas vezes estão à procura de algo mais substancial, recompensador e de longo prazo que um encontro casual. "Suspeito que muito do sexo que os jovens estão fazendo é para procurar um parceiro… então o sexo não é realmente pelo prazer; é para esse propósito de encontrar alguém", diz Wade.

Em outras palavras, muitos millennials estão secretamente procurando algo mais, mas agindo com esse desinteresse performático para cobrir seu ego. E provavelmente não é surpresa que essa rota, testes utilitários de parceiros, não rende o sexo mais quente também. "Se você está procurando por um parceiro numa cultura que espera que você faça sexo antes de expressar sentimentos românticos, esse sexo se torna parte do jogo", diz Wade. "Então você não espera que o sexo seja necessariamente incrível, porque está meio que testando pessoas."

E essa dinâmica — sexo como uma meio estratégico para um fim — é a história mais velha do mundo.

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Tradução: Marina Schnoor

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