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O Cara que Imprime Armas Quer Ser o "Eticista do Bitcoin"

O Cody Wilson, aquele cara que usa impressoras 3D para fazer armas e que disponibilizou o projeto gratuitamente pela internet, quer criar uma ética para o Bitcoin.

Imagem via Wikimedia Commons.

“Quero desenvolver uma ética para o Bitcoin”, disse Cody Wilson para uma multidão extasiada em Londres. “Acho que o Bitcoin ainda não tem um eticista forte.”

É provável que você conheça o Wilson como sendo o cara que usa impressoras 3D para fazer armas e que disponibilizou o projeto gratuitamente pela internet. Com seu mais recente empreendimento, uma carteira virtual chamada Dark Wallet, ele está trazendo sua filosofia libertária para o Bitcoin. O Dark Wallet é um plug-in de navegador que permite que o usuário armazene, receba e envie bitcoins com segurança e de maneira anônima — ele, claro, é de código aberto. Depois de mais de um mês, o projeto ainda precisa atingir seu objetivo de crowdfunding no IndieGogo: US$50 mil em doações padrão. No entanto, isso já valeu um convite para que Wilson falasse na Bitcoin Expo 2013 em Londres, um evento que teve centenas de mineradores de dados, empreendedores e entusiastas lotando dois locais em Shoreditch para discutir o presente e o futuro da moeda criptografada.

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A chegada do palestrante de 25 anos no Reino Unido causou um belo burburinho, com rumores se espalhando de que ele teria sido detido na chegada pelo Ministério do Interior (o que não é verdade, ele confirmou) e com o jornal britânico The Independent estampando a manchete “Cody Wilson criou uma arma que pode ser baixada e montada com uma impressora 3D –— será que ele é perigoso demais para a Inglaterra?” Wilson certamente não é tímido na hora de agitar as coisas para expressar seus pontos de vista e agora ele apontou a si mesmo como um tipo de porta-voz da causa do dinheiro criptografado.

Subindo ao palco com botas bem engraxadas, uma jaqueta jeans e, bizarramente, só uma luva preta (o que não foi intencional, ele me disse depois que tirou acidentalmente só uma das luvas antes de entrar em cena), Wilson comandou uma palestra bem calma, algo que faltou no resto da conferência, que frequentemente teve palestrantes brigando com um fundo caótico de discussões, debates e trocas de bitcoins.

Depois de pedir que o público contribuísse para o fundo de defesa de Ross Ulbricht, o suposto fundador do Silk Road,  — “Esse cara é um gênio e pináculo de tudo que é Bitcoin e libertário” — ele explicou que o Dark Wallet lutava contra “o que o Bitcoin acabou se transformando”.

Wilson argumentou que o Bitcoin está se tornando cada vez mais um brinquedo de capitalistas de risco e uma recriação do estado em miniatura, e falou contra os “caras de vinte e poucos anos de terno” que favorecem capitais de risco com seus startups Bitcoin, reduzindo a moeda a pouco mais que uma solução para vendedores e consumidores (observe que muitos desses “caras de vinte e poucos anos de terno” subiriam no palco naquele mesmo dia para divulgar essas mesmas soluções). Os problemas principais, disse ele rindo, estão na linha do “Como diminuímos os custos de transação?” ou “Como adicionamos mais contas?”.

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Para Wilson, assim como muitos outros devotos de Satoshi, o Bitcoin é muito mais do que isso; a moeda tem o potencial para ser “um meio de proibir e expor o Estado”. Segundo o argumento dele, ver o Bitcoin como uma mera solução de pagamento transforma isso “numa lubrificação nova e melhor para nossa dominação. É o novo KY, gente”.

Depois da palestra, conversei com Wilson sobre sua visão do Bitcoin e como isso se encaixa em seus ideais de criptoanarquista. Ele explicou que conheceu a moeda criptografada em 2009 ou 2010, enquanto estava na faculdade de economia, mas que não percebeu quão bem isso se encaixava em suas políticas naquele momento. “Quando começamos a Defense Distributed em 2012, o IndieGogo tirou a gente do ar e comecei a me preocupar com a possibilidade de o Paypal fazer o mesmo. Depois, li uma página do WikiLeaks e comecei a aceitar o Bitcoin”, ele disse. Wilson conheceu Amir Taaki, um dos desenvolvedores do Bitcoin mais conhecidos, na conferência de 2012 e eles começaram a desenvolver a ideia do Dark Wallet juntos.

O Bitcoin significa muitas coisas para muitas pessoas; uma moeda, um commodity, uma declaração política. Esta última é a que tem mais valor para Wilson, que vê isso como parte de um projeto libertário maior. Perguntei qual a relação entre Bitcoin e armas, dado o interesse dele nas duas coisas.

“Os dois se relacionam com condições de poder; condições de um para o outro. Poder vem de armas. Poder vem de riqueza, privilégio e dinheiro; as três coisas parecem incestuosamente inter-relacionadas”, ele disse. “As duas coisas vêm de um uso libertário da internet como meio de resistência.”

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Mas para que o Bitcoin retenha esse apelo libertário, é importante que isso preserve suas características originais de privacidade e descentralização, e resista a tentativas de regulamentação. “O Bitcoin tem alguns princípios que são totalmente antiéticos para o paradigma moderno do monetarismo, gerenciamento de riqueza e navegação de economias baseadas em superpotências”, disse Wilson. “Isso é simplesmente antiético para todas essas coisas; isso mantém um espaço para privacidade. No final, ninguém questiona isso; o Bitcoin é resistente ao capricho político.”

Assim, proteger essas qualidades é o principal objetivo do Dark Wallet, que, segundo Wilson, conseguiu o dobro de seu objetivo de US$50 mil quando as doações em Bitcoin são incluídas na conta. A ferramenta pretende representar um ethos mais amplo para o Bitcoin e Wilson diz que outros projetos de privacidade poderão receber um “certificado Dark Wallet” — um selo de aprovação da facção libertária do Bitcoin. O vídeo da campanha, segundo ele, resume isso: “Achei que era necessário ter primeiro um momento cultural onde explicamos: olha, achamos que o Bitcoin pode ser isso e aquilo”, ele disse. Wilson sente que o ethos original do Bitcoin como algo radical e revolucionário se perdeu na narrativa predominante — “Como os anarquistas perderam o controle e foram as pessoas com dinheiro e mais maduras que finalmente começaram a desenvolver isso”.

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Mas Wilson admite que o produto não é tão diferente dos outros serviços de Bitcoin, emprestando características do Electrum, Hive e Obelisk. “É uma canibalização inteligente de muitas coisas que já estão no espaço, mas, ao mesmo tempo, sua intencionalidade direta e PR são mais fortes, então, vendemos isso diferente”, ele disse. “Nosso ímpeto é o usuário, a privacidade dele e a politização do Bitcoin para a eternidade. Essa é a verdadeira diferença.”

Claro, Wilson tem outros interesses além dos puramente políticos — ele mesmo tem alguns bitcoins. Ele quase me disse o valor, mas se esquivou porque as pessoas poderiam ficar não muito felizes sabendo que ele pediu doações para o Dark Wallet tendo tanto dinheiro na conta. Mas ele revelou que comprou muito Bitcoin há um ano, mas que teve que gastar mais do que gostaria no verão, quando a renda regular esfriou. E ele não pretende deixar o resto ir embora. “Estou poupando, o que você acha?”, ele riu. “Não parece que as coisas estão desacelerando no momento.”

Antes que ele saísse para falar com mais admiradores e pousar para fotos (acho que o povo do Bitcoin não tem muitas celebridades), perguntei sobre as recentes alegações da imprensa de que “Ele é mesmo perigoso?”. “Não muito”, ele disse, acanhado. “Qual é, sou um cachorrinho.”

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