Em 1982, um músico de sessão veterano de Mumbai, Índia, decidiu tentar algo diferente. Depois de ele ter contribuído com alguns dos maiores hits de Bollywood com as suas linhas de baixo ásperas e riffs melódicos de guitarra havaiana, a compra de um sintetizador Roland TB-303 e de um teclado Jupiter-8, em uma viagem a Cingapura, estimulou-o a ampliar os horizontes da música tradicional na Índia. Charanjit Singh levou a simples ideia de compor ragas indianas para os beats sintetizados mecanicamente, algo que os seus novos brinquedos o ajudaram a fazer.
Singh corporificava o zeitgeist das trilhas sonoras indianas da metade dos anos 80. Os sons pulsantes da disco e do techno haviam cruzado lentamente as fronteiras do país, infiltrando-se na consciência coletiva dos músicos ligados ao cinema. Em uma extremidade do espectro, isto resultou em alguns dos maiores hits do cinema indiano. No outro extremo está o disco pioneiro de Singh, Synthesizing: Ten Ragas To A Disco Beat. O disco combinava ragas conhecidas — o formato tradicional de canção da Ásia meridional — com produção eletrônica, criando um som que anos depois inspiraria a criação do acid house. Gravado em apenas quatro dias, em um estúdio no centro de Mumbai, em 1982, a obra caiu lentamente no esquecimento — junto com o próprio Singh.
Videos by VICE
A obra permaneceu esquecida até Edo Bouman, especialista em Bollywood, aparecer na casa de Singh em Mumbai, em 2002. Bouman havia descoberto o disco de Singh por acaso, em uma loja de discos de Nova Deli. Maravilhado com o que ouviu, pediu a permissão do artista para relançá-lo pelo seu selo, Bombay Connection. Sem mais nem menos, o ressurgimento de um talentoso compositor começava a se desenhar duas décadas depois de ele criar a sua obra mais influente.
Quem conheceu o Sr. Singh sempre irá se lembrar dele como um homem de bom coração e voz suave. Alguns o batizaram como o “Pioneiro do acid house”. Artistas contemporâneos da Ásia meridional, como Talvin Singh, creditam-no como o “Guru da Música Eletrônica Oriental”. Títulos à parte, Singh foi um inovador que simplesmente ampliou os horizontes de como entendemos música de “fusão” com o seu toque pessoal.
O amor e respeito que ele recebeu nos últimos anos não foram nada menos do que fenomenais. Aos 72 anos, ao lado do músico holandês Johanz Westerman (que masterizou o disco no seu relançamento), Singh se apresentou em uma série de clubes e entreteve plateias muito mais jovens do que ele em Londres, Glasgow, Copenhague, Malmö e Nova York, antes de voltar para casa para ser a atração principal da primeira edição do festival Magnetic Fields, em Rajasthan, na Índia.
Aqueles que foram apresentados à música do Sr. Singh através de Ten Ragas To A Disco Beat chegaram mesmo a perceber que esse disco era só a ponta do iceberg. Singh foi um músico que passou a sua carreira inteira inovando e experimentando com ideias diferentes, tentando atingir novos patamares de revolução musical no caminho.
Charanjit Singh faleceu no dia 3 de julho em Mumbai. Ele tinha 75 anos.
Adwait Patil está no Twitter.
Tradução: Fernanda Botta
More
From VICE
-
(Photo by Francesco Castaldo/Pacific Press/LightRocket via Getty Images) -
M Scott Brauer/Bloomberg via Getty Images -
Firefly Aerospace/YouTube -
Justin Paget / Getty Images