Numa tarde de sábado ano passado, me sentei numa igreja reformada de 100 anos em Zandvoort, uma cidade costeira da Holanda, e tomei cerca de 30 miligramas de psilocibina, o ingrediente ativo dos cogumelos mágicos.
Isso foi algo muito inusitado pra mim. Não uso drogas desde os 20 e poucos anos. Gosto da sensação de estar absolutamente no controle, e recuo diante de incertezas. Entregar meu cérebro e senso de realidade para um fungo era uma ideia aterrorizante. E mesmo assim, fui para um retiro de psilocibina legal para fazer exatamente isso.
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No último ano, estou cobrindo o ressurgimento da pesquisa psicodélica. Pessoas com depressão resistente a tratamento, vício e ansiedade relacionada com doenças terminais então encontrando o que parece ser um alívio incrível nessas drogas. Como alguém com ansiedade e TOC, eu estava curiosa para saber como cogumelos podiam me libertar dos meus hábitos mal adaptados, e os pensamentos ruminantes que parecem ficar comigo não importa quantos anos de terapia eu faça.
Eu não estava sozinha nessa intenção; as 14 outras pessoas no retiro não viajaram do mundo inteiro para usar cogumelos de forma recreativa. Durante nossas apresentações, muitos falaram sobre querer melhorar a qualidade mental da vida, acessar níveis mais altos de espiritualidade, ou encontrar jeitos de abordar sentimentos de que algo estava faltando. Metade delas nunca tinha tomado psicodélicos, e não tinham interesse nisso até ler sobre o ressurgimento da medicina psicodélica em lugares como o New Yorker ou The Economist. Quase todo mundo mencionou ter sido influenciado pelo novo livro do jornalista Michael Pollan, How to Change Your Mind, um best-seller que aborda o pico recente nas pesquisas.
Psicodélicos podem estar se infiltrando nas listas de leitura da elite, mas tomar essas drogas em cenários formais com médicos as administrando ainda é algo muito difícil. Testes nos Reino Unido têm milhares de pessoas nas listas de espera, incluindo quem já participou e quer participar de novo, disse Rosalind Watts, psicóloga do estudo de depressão e psilocibina do Imperial College London. “No final de cada palestra que dou, tem uma fila de pessoas dizendo ‘Preciso experimentar isso. Onde posso ir?’”, Watts me disse.
Diante dessa procura, retiros psicodélicos estão aparecendo para preencher este vácuo. Eles estão espalhados pelo mundo todo, geralmente em lugares onde há buracos na lei. Na Holanda, por exemplo, trufas – a base dos cogumelos – são legalizadas, e é isso que consumimos.
Fui para um retiro chamado Synthesis. Você paga US$ 2 mil por três dias (eles removeram a taxa pra mim e a VICE pagou apenas pelo transporte para Amsterdã e a volta). Eles fornecem acomodações modernas impecáveis – com uma sauna, chef vegetariano e até um suprimento inesgotável de chás. O retiro consiste de um dia de preparação, um dia em que tomamos as trufas, e um dia dedicado para integração, ou processar nossas experiências. São quatro facilitadores para guiar 15 clientes, e dois deles são profissionais de saúde mental. Também tinha um médico presente no dia da nossa viagem.
Retiros são vendidos como lugares para transformação mental e crescimento. Mas a experiência de um retiro pode ser muito diferente da de um teste clínico. Não há precedentes para como um retiro psicodélico “deve” ser, ou que tipo de apoio eles precisam fornecer. O Synthesis está no lado responsável e seguro do espectro; há outros retiros sem psicólogos ou médicos treinados, onde os facilitadores tomam cogumelos com os participantes. Alguns não fazem uma triagem completa para transtornos mais sérios de saúde mental.
Enquanto psicodélicos vão perdendo sua reputação datada da era Nixon, uma nova geração de usuários interessados vão buscar essas drogas. São pessoas como eu: que não querem usar psicodélicos ilegalmente ou sem supervisão, não estão necessariamente interessados nos efeitos recreativos, mas estão empolgadas com a promessa médica.
Dentro desse grupo também tem pessoas (como eu) com graus variados de transtornos de saúde mental, que toparam com a pesquisa psicodélica atual e não podem nem vão esperar pela legalização.
Sendo assim, retiros se arriscam a se tornar um campo de teste para questões ainda não resolvidas sobre essas drogas como tratamento: quanto apoio uma pessoa precisa durante uma viagem para ter cura mental? Esse apoio deve vir de psicólogos e psiquiatras – ou xamãs? É melhor tomar essas drogas em grupo ou sozinho? Qual a dose certa? E microdosagem? Uma viagem médica é diferente de uma recreativa? Tem algum jeito de prever quem pode ter uma bad trip?
Fui para o Synthesis não só para ver o que cogumelos podiam fazer pela minha vida, mas para ver como o movimento de bem-estar com psicodélicos vai parecer – não só no contexto clínico, mas como uma forma nascente de turismo médico e saúde mental DIY.
Durante três dias, observei outras pessoas tendo o tipo de momento transcendental sobre o qual li tanto. Mas o que eu passei foi algo diferente. Minha viagem não foi divertida. Foi altamente emocional, dolorosa e, em certos momentos, abordada como sendo profundamente terapêutica – mas talvez não tanto quanto poderia ter sido.
Eu estava muito ansiosa mesmo só de considerar ir para um retiro de outro tipo, digamos, um retiro de ayahuasca na floresta brasileira. Esse tipo de retiro acontece há séculos, tem um significado cultural, mas também inclui vomitar, dormir no relento e comer alimentos não-familiares. O Synthesis era diferente: eu tinha amenidades. Chuveiro. Uma cama. Água com infusão de frutas, Uma chef holandesa chamada Lotta, que trazia alqueires de produtos orgânicos todas as manhãs.
Synthesis é a primeira onda de um novo tipo de retiro psicodélico. Ele alinha sua missão com uma nova ciência e projetos de pesquisa, não só o místico. O Synthesis copia muitas de suas práticas do Imperial College London – um dos melhores centros médicos do mundo trabalhando com psicodélicos – quando administra a psilocibina, e colabora com os pesquisadores de lá, fornecendo dados sobre as experiências das pessoas que tomam psicodélicos num cenário de grupo. Mas isso cria um híbrido um tanto confuso. Isso é um spa? Uma viagem de férias? Um estudo de pesquisa? Uma consulta médica? Uma sessão de terapia?
Fui para o Synthesis não só para ver o que cogumelos podiam fazer pela minha vida, mas para ver como o movimento de bem-estar com psicodélicos vai parecer – não só no contexto clínico, mas como uma forma nascente de turismo médico e saúde mental DIY.
Esse novo tipo de retiro ainda é substancialmente diferente de um teste de pesquisa real. Na Imperial, por exemplo, os participantes passam por um processo extenso de triagem, onde discutem sua saúde mental, mas também sua infância e traumas passados, o que começa a criar uma confiança no terapeuta, me disse Watts. Aqui são cerca de cinco horas de preparação individual com um terapeuta. Os participantes tomam psilocibina duas vezes, com dois guias ajudando cada pessoa, geralmente um psicólogo e um psiquiatra. São duas horas de integração depois de cada dose, e três ligações de acompanhamento por Skype de uma hora.
Watts reconhece que nem todo mundo precisa disso. O cenário do retiro é em grupo, com menos tempo de preparação e atenção individual, o que pode ser OK para a maioria das pessoas. “Mas algumas precisam de mais”, disse Watts. “Certamente para pessoas que têm um histórico de depressão pela vida toda, então elas vão precisar de muito mais.”
Conheci Gemma, uma designer de 31 anos que mora em Portland, no carro que nos trouxe da estação de trem de Amsterdã para Zandvoort. Mais tarde ela me disse que tinha depressão desde a adolescência. Dos 18 aos 28 anos ela usou vários antidepressivos.
Muitos novos retiros psicodélicos não recomendam que pessoas com questões sérias de saúde mental participem. No Synthesis, todo participante tem que passar por uma triagem de saúde. Myles Katz, cofundador do Synthesis, me disse que eles recusam cerca de metade das pessoas que se inscrevem.
O funcionário de triagem médica do Synthesis perguntou a Gemma sobre sua depressão, e quando ela abriu sua história, ele fez mais perguntas sobre sua saúde mental. “Mas sinceramente não sei onde estou mentalmente”, ela disse. “Vou trabalhar todo dia. Saio e socializo. Não fico na cama o dia inteiro e nunca fui internada. Mesmo assim, tenho vivido com isso por muito tempo e estou num espaço onde me acostumei com o jeito que sou.”
Apesar de retiros serem tecnicamente para os chamados “normais saudáveis”, em todo site de retiro com psilocibina que vi, incluindo o Synthesis, eles se vendem como lugares de cura mental. (Junto com uma advertência dizendo que eles não estão fornecendo cuidado médico oficial.) “Seu corpo e mente sabem como se curar; psilocibina nos permite confiar em nós mesmos de novo”, eles escreveram no site do Truffles Therapy no México. “A única exigência é sua disposição para se render a suas ideias e deixar a natureza fazer o que ela faz melhor.”
O retiro Buena Vida, também no México:
“Você acha que seu regime de saúde mental, terapia e medicação te ajuda a ‘seguir em frente’ mas não realmente ir AO FUNDO?… Você sofre de depressão, ansiedade ou transtorno de estresse pós-traumático há tanto tempo que não lembra como é se sentir bem?… Quem está procurando curar uma depressão crônica, ansiedade, baixa autoestima, falta de criatividade, TEPT ou simplesmente uma falta de propósito em suas vida, com certeza vai se beneficiar de uma sessão segura com cogumelos de psilocibina.”
Esse enquadramento pode atrair pessoas com histórico de doenças mentais. Enquanto Gemma se aproximava dos 30, ela começou a explorar remédios naturais e alternativos, se consultando com naturopatas, fazendo ioga e usando suplementos. Sua naturopata perguntou se ela já tinha ouvido falar em microdosagem, e ela começou a ler sobre psicodélicos, logo antes do livro de Michael Pollan sair. Uma sexta à noite, sozinha em casa, ela achou o site do Synthesis.
“Pensei ‘Meu deus, isso é incrível’. Você lê sobre todas essas coisas, mas aqui tem um lugar onde as pessoas podem ir e fazer isso”, ela disse. “As pessoas dizem que isso é quase como a cura para a depressão. Sei que eles não dizem isso no site, mas você lê tantas coisas positivas que começa a fazer sentido. Pensei ‘Tenho que fazer isso’. Lembro de sentir algo como ‘Uau, meu futuro pode ser tão diferente’.”
Fomos recebidas no Farol, como a igreja reformada é chamada, pelos nossos guias Adam, Valerie, James e Odin. Eles estavam vestido, como já era de se esperar, com roupas esvoaçantes e tinham uma vibe de paz.
Adam, um instrutor de ioga americano e mestre de reiki certificado que mora em Berlim, era nosso principal facilitador. Valerie, de Oakland, é terapeuta de família do California Institute of Integral Studies (CIIS), um programa de psicoterapia assistida com psicodélicos; estagiários do CIIS vão para retiros para experimentá-los em primeira mão como parte de seu currículo. Valerie e James, um britânico com rabo de cavalo e voz gentil, eram os únicos terapeutas licenciados no retiro.
Logo depois que chegamos, nos reunimos na cozinha e sala de estar cavernosa, cumprimentando os outros clientes. (Para proteger a privacidade deles, e também não interferir com os efeitos do programa, só estou incluindo testemunhos daqueles que consentiram em ser entrevistados duas semanas depois do retiro.)
No nosso dia de “preparação”, o tempo parecia se estender diante de mim, e eu estava me coçando de curiosidade. Falamos como grupo sobre nossas intenções, e os planos para o dia seguinte, ou, como Adam chama, nossas “Instruções de Voo”.
Houve muita ênfase em “se soltar” independente do que pudéssemos experimentar. Adam disse para “confiar, se soltar e estar aberto”. Se você estivesse procurando por um mantra, ele sugeria respirar no “se” e exalar no “soltar”. Ele nos garantiu que não existia isso bad trip – tudo que acontecesse nos ensinaria alguma coisa.
No dia seguinte, participamos num tipo de cerimônia do chá, esmagando as trufas com um pilão junto com limão e gengibre. Fomos para a “sala de cerimônia”, um salão branco com teto solar e chão aquecido. Havia colchões para nos deitar, cobertores e vendas para os olhos – para encorajar uma jornada interna e introspectiva (e isso que muitos protocolos pedem também). Minhas mãos estavam tremendo enquanto eu bebia o chá de cogumelos e colocava as trufas amassadas do fundo da caneca na minha boca. Me deitei e coloquei a venda.
A primeira hora foi fisicamente esmagadora. Era como se eu estivesse dentro de um caleidoscópio que alguém estava chacoalhando muito rápido. Me senti tonta e em pânico. Em certo ponto, abri os olhos e vi Adam sentado perto de mim. Devia ser óbvio que eu estava sofrendo, porque ele colocou as mãos sobre mim – sem me tocar, mas fazendo reiki. Senti calor, dor e não estava gostando. Tentei empurrar as mãos dele, e ele me disse para respirar e me soltar no que eu estava sentindo. Isso teve o efeito oposto de me acalmar: comecei a ficar frenética, e de repente era urgente que outra pessoa se sentasse comigo que não fosse ele.
Um dia antes, Valerie me disse que se começasse a me sentir sobrecarregada, eu podia procurar por ela. Pedia ao Adam para chamá-la, e ele me disse que ela tinha saído pra almoçar.
Eu não conseguia entender como isso era possível. Por um momento, achei que estava alucinando, o que me aterrorizou. Eu não tinha mais certeza do que estava acontecendo ao meu redor. Eu não conseguia descobrir onde eu estava, ou quanto tempo tinha passado – tudo enraizado na confusão com a Valerie tendo saído para comer. (Descobri mais tarde que todos os guias fazem um almoço rápido de 20 minutos.) Achei que meu cérebro estava escondendo ela de mim, que era minha culpa que eu não podia ver a única pessoa que podia me ajudar. Existi dentro desse desespero, ódio por mim mesma e confusão pelo que pareceu horas.
Eventualmente, a Valerie voltou, e quando ela sentou do meu lado, comecei a chorar. Eu queria que ela segurasse minha mão ou me tocasse pra eu saber, mesmo com os olhos fechados, que ela estava lá, mas não sabia como pedir.
Depois de um tempo, consegui perguntar se podíamos sair da sala de cerimônia para dar uma pausa da música tocando nos alto-falantes, eu que estava achando muito alta. Fomos para a sala de estar e jantar, onde Lotta, a chef, estava cortando legumes.
Ouvindo uma mulher preparando comida, me sentindo unida com a Valeria, e minha mente se voltou para minha mãe, minha avó e minha bisavó – a linha matriarcal da minha família. Minha mãe é chinesa e cresceu durante a Revolução Cultural. Passei muito tempo de terapia falando sobre o trauma que ela passou e meu relacionamento com isso. Mas sob o efeito dos cogumelos, comecei a experimentar isso de um jeito tangível como nunca senti antes.
Me senti literalmente conectada com todas as minhas parentes mulheres, e comecei a pensar nas histórias que tinha ouvido sobre as infâncias e vidas delas. Cenas vinham e iam – minha bisavó comandando seu restaurante, e depois sendo obrigada a se tornar uma empregada pela família do marido. Minha avó fugindo de casa aos 12 anos e morando no sótão de uma biblioteca. Minha avó nos campos de trabalho forçado durante a Revolução Cultural. A babá da minha mãe roubando comida durante a Grande Fome.
Com meu cérebro indo e voltando da China Comunista, contei para Valerie sobre minha bisavó, minha avó e minha mãe. Senti a solidão arrasadora da negligência que elas sofreram e a rigidez delas colocando tudo de lado exceto sua sobrevivência.
Mas enquanto experimentava tudo isso, eu também tinha algum nível de compreensão de que eu não devia estar fora da sala de cerimônia. A Valerie não devia estar sentada lá comigo. Ela era uma das quatro pessoas lá para cuidar de 15. Eu a estava tirando do grupo que também precisava do cuidado dela.
Num momento de lucidez, olhei pela janela para o quintal e vi a Gemma, sentada lá chorando – ela parecia angustiada. Me senti horrivelmente culpada por tirar uma das pessoas que estava ali para ajudá-la. Esse conhecimento tornou minha jornada mais difícil – até mais já que eu estava pensando nos termos de cuidado, e meu desejo muitas vezes reprimido de que outros tomem conta de mim. Aqui eu estava pedindo por cuidado, mas sabendo no fundo que estava pedindo demais considerando o contexto em que estava.
Enquanto passei a maior parte do meu dia chorando, Christopher, um homem de 50 anos de Monterey, Califórnia, passou o dia rindo. Ele disse que os cogumelos disseram que ele tinha passado tempo demais da vida chorando, e que agora era hora de rir, e não se sentir culpado. Em seu diário ele escreveu: “Vou apenas rir o tempo todo. Eu mereço, porra”.
Mesmo dentro daquele prazer, a história da família dele veio a sua mente. “Percebi muito vividamente que minha mãe estava vivendo dentro de mim, e não apenas ela, mas as pessoas que vivem dentro dela também estavam em mim”, ele disse – um sentimento que me lembrou da minha própria jornada. Outro trecho do diário dele dizia: “Imagino como uma infância divertida deve ser”.
Duas semanas depois da nossa viagem, Christopher notou algumas mudanças sutis em sua vida. Ele costumava reagir intensamente a circunstâncias adversas, mas agora se via parando antes de responder. Ele disse que sentia uma maior de conexão com as pessoas – mesmo com aquelas que ele não conhece. Ele nunca foi o tipo de pessoa que se maravilhava com a conexão de todas as coisas, mas disse que agora o instinto de fazer isso vem facilmente. “Não estou falando sobre uma enorme transformação que ocorreu e que estou mudado pra sempre”, disse Christopher. “São pequenas mudanças. Isso abriu novos jeitos de ver as coisas e maneiras de se comportar e responder.”
Ed tinha 72 anos quando esteve no Synthesis, agora ele tem 73. Ele é um advogado em Manhattan que tentou usar medicação, mas sempre tinha algum bloqueio que ele não conseguia superar. “Achei que isso podia ser um facilitador para me ajudar a superar”, ele disse. “Todas as respostas do mundo material não era suficiente. Eu pensava que tinha que haver mais, mas ainda não encontrei esse mais.”
Ed também saiu do Synthesis com uma sensação maior de conexão. “Tive uma impressão de conhecimento, certeza e um sentimento de paz e grande conforto que há nessa unidade entre mim, outras pessoas, a natureza e o mundo”, ele disse. “Tinha uma sensação esmagadora de gratidão por estar vivo neste lugar. Gratidão pelos outros, e amor.”
Durante sua viagem, ele me disse que foi para o Ganges com um guru, e conduziu uma sinfonia, alucinações que ele experimentou como um sonho. “Teve muita alegria durante o curso da jornada”, ele disse. “Essa felicidade e alegria que estavam enterradas muitos anos dentro de mim. E tudo estava saindo. Tinha um grande sorriso no meu rosto, e experimentei um êxtase de alegria – era demais.”
A experiência de Gemma foi mais como a minha. Ela viu os mesmos visuais no começo, coisas naturais espiralando, o que a fez sorrir. Mas depois de um tempo, ela não tinha certeza de onde estava, e se sentiu fisicamente muito desconfortável. “Sabe aquele tipo de sensação antes de você ter uma gripe?”, ela disse. “Você acorda no meio da noite e pensa ‘Tem algo errado com meu corpo. Vou ficar doente’.”
No começo da cerimônia, Gemma tentou “se soltar”. Mas algo não estava encaixando. “Eu dizia pra mim mesma ‘Seu corpo só vai te dar o que você pode aguentar’, e ‘O que você está tentando me ensinar?’ Eu não estava conseguindo nenhuma dessas respostas”, ela disse. “Tive uma bad trip? Não me vi morrendo. Eu não estava aterrorizada ou tendo visões horríveis. Eu só estava com bastante medo e ansiosa.”
Do nosso grupo, só Gemma e eu tivemos viagens que eu definiria como “difíceis”. Foi porque temos questões de saúde mental preexistentes? Pelo trabalho qualitativo de Watts, ela descobriu que há uma diferença entre grupos de pessoas que tomam psicodélicos e que tem história psiquiátrica ou traumática. “Faz sentido que vocês tiveram que passar por essas camadas primeiro”, ela disse.
Pessoas tomam psicodélicos todo dia e não estão acompanhadas de um terapeuta. Não exigimos que todo mundo no Burning Man traga seu terapeuta quando toma LSD. Mas esses retiros não são só outros lugares para o uso recreativo. Eles são pensados para pessoas terem experiências profundas e de cura, e fazendo isso, podem atrair pessoas com preocupações de saúde mental que querem se curar. E nesse cenário, não deveria haver alguém presente que é especialista em lidar com isso?
Eu dizia pra mim mesma “Seu corpo só vai te dar o que você pode aguentar”, e “O que você está tentando me ensinar?” Eu não estava conseguindo nenhuma dessas respostas. Tive uma bad trip? Não me vi morrendo. Eu não estava aterrorizada ou tendo visões horríveis. Eu só estava com bastante medo e ansiosa.
Um retiro na Jamaica, Mycomeditations, diz em seu site que enquanto fornece psicólogos e terapeutas antes e depois dos retiros, não há sempre um terapeuta presente. Além disso, metade dos facilitadores tomam os cogumelos com os clientes. “Eles precisam identificar o ‘ponto certo’, para poderem simpatizar e ajudar com clientes que estão no espaço dos cogumelos de maneira mais eficiente”, diz o site. O Synthesis não permite que seus facilitadores tomem psilocybina, e isso vai contra a prática clínica. O que é considerado aceitável de retiro para retiro pode variar muito.
O Psychedelics Today, que entrevistou os donos do Mycomeditations várias vezes em seu podcast, recentemente liberou uma declaração retirando seu apoio ao retiro, dizendo que “A equipe parece ter boas intenções, mas há sempre peças perdidas em segurança que não nos permitem endossar a empresa daqui para frente”.
Uma discussão amarga começou na página do Facebook do Psychedelics Today com pessoas que foram para o retiro e tiveram experiências diferentes. Alguns achavam que o retiro estava aceitando pessoas vulneráveis demais e não conseguia fornecer o apoio apropriado, outros disseram que tiveram experiências incríveis de cura.
Katherine MacLean, pesquisadora do Johns Hopkins que foi facilitadora voluntária num dos retiros Mycomeditations, disse que testemunhou uma ou duas emergências médicas em cada um dos dois retiros a que foi, incluindo várias horas de vômito e diarreia severas – apesar de dizer que é normal ver isso com cogumelos – e uma pessoa que perdeu a consciência e caiu, batendo a cabeça no concreto.
Além disso, o retiro aceita pessoas “em risco significativo de autoflagelação, incluindo pessoas com condições físicas e psicológicas que são excluídas de outros retiros de psicodélicos e meditação, e certamente recusadas em testes clínicos”. Ela ficou “desconfortável em oferecer preparação e apoio de integração para pessoas extremamente deprimidas, ansiosas, suicidas, com dependência de substâncias… e falei sobre minhas preocupações em aceitar outros casos sérios e vulneráveis”.
Um fundador do Psychedelics Today, Kyle Buller, disse que quando ele foi para o Mycomeditations, as pessoas tomavam cogumelos num campo aberto. “Todo mundo era convidado a trazer a própria música e sabe, às vezes parecia algo muito tosco”, ele disse. “Alguns facilitadores eram ótimos mesmo estando sob o efeito. Eles faziam um ótimo trabalho em abrir espaços, mas às vezes eu imaginava: de quem é essa experiência? É a viagem do facilitador ou do participante?”
Matthew Johnson, um psiquiatra e diretor associado do Centro de Pesquisa de Psicodélicos e Consciência do Johns Hopkins, disse que mesmo acreditando profundamente na promessa da terapia com psicodélicos, ele não pode recomendar nenhum retiro por causa da grande variabilidade e falta de supervisão profissional. Ele disse que essas drogas no geral são seguras, mas ainda há riscos. Em qualquer cenário clínico eles estão melhor equipados para lidar com esses riscos – sejam físicos ou mentais.
Ele também se preocupa com os impactos que a ascensão de retiros pode ter na pesquisa atual. Se ninguém está guiando o que eles estão fazendo, resultados ou experiências ruins podem prejudicar a reputação da ciência sendo desenvolvida agora.
Você não precisa voltar muito na história dos psicodélicos para encontrar exemplos de dosagens feitas de modo errado, ele disse. “Sou obcecado pelas lições do passado nessa área, e faço meu melhor para moldar o campo para continuarmos absorvendo essas lições”, me disse Johnson. “São muitas dimensões onde os limites são tênues cercando psicodélicos. Nos preocupamos com isso. Tipo, se a lei é aprovada no Oregon e algum life coach está supervisionando uma sessão e alguém foge e se machuca, as pessoas vão dizer ‘ah, pesquisa com psicodélicos não é segura’.”
Perguntei a Johnson se uma solução em potencial seria separar pessoas como Gemma e eu – fornecendo níveis diferentes de apoio – para que eu tivesse uma pessoa – ou duas – comigo o tempo todo. Ele não tem certeza. Ele disse que mesmo se pudéssemos criar uma linha entre pessoas “saudáveis” e “não-saudáveis”, ainda há muita coisa imprevisível.
“Você pode necessitar de um cuidado maior”, disse Johnson. É por isso que, no cenário clínico, há psicólogos e psiquiatras que constroem uma relação com seus pacientes experimentando trauma, depressão e ansiedade.
Ele lembra de um estudo com psilocibina que conduziu com participantes que eram pessoas com experiência em meditação; gente que fez dezenas de milhares de horas de meditação. “Você pensaria que essas pessoas são bem resolvidas, sabe?”, ele disse. “Tipo, elas já resolveram suas questões da infância e tudo mais. Bom, não é bem assim. Coisas surgem com qualquer ser humano, mesmo sem um histórico explícito de trauma. Somos complexos, e pessoalmente acho que cada humano tem um certo nível de trauma não resolvido, seja diagnosticável ou não. Acho que não existe uma pessoa no mundo de quem você poderia dizer ‘É, ela vai tomar uma dose alta de psicodélicos e nenhuma questão profunda vai surgir’. Não acho que essa pessoa existe. Humanos são muito profundos.”
Logo depois do meu final de semana no Synthesis, fui para Berlim para uma conferência sobre medicina psicodélica organizada pela MIND European Foundation for Psychedelic Science. Um painel de discussão chamava: Terapeutas vs. Curandeiros: Exigências para Treinamento e Personalidade de Terapeutas Psicodélicos. Previsivelmente, os médicos do painel sentiam que algum tipo de treinamento profissional era importante para guiar uma pessoa numa viagem, enquanto “curandeiros” com experiência sentiam que não – que conhecimento profundo dessas drogas era mais importante.
Johnson disse que não acha que haverá um benefício clínico para alguém que passa o tempo todo sentindo que não sabe no que se meteu, ou que não pode confiar nas pessoas ao seu redor. “Você provavelmente não vai se entregar psicologicamente à experiência, que é o que você realmente precisa para tirar benefícios disso”, ele disse. “Você não pode se entregar quando tem segundas ideias como ‘O que está acontecendo aqui?’”
Uma viagem difícil num retiro ainda pode ajudar na cura, mas também pode retraumatizar, especialmente alguém que tem questões de abandono, disse Gita Vaid, psicoterapeuta que usa ketamina, que também tomou as trufas comigo no Synthesis. “Se alguém não está disponível nesses momentos críticos, não é apenas uma oportunidade perdida, pode ser um gatilho.”
Elizabeth Nielson, psicóloga e pesquisadora de psicodélicos que foca em integração, disse que frequentemente recebe ligações de pessoas que foram para retiros e estão sofrendo depois. Nem sempre elas tiveram uma bad trip, mas às vezes o que elas experimentaram é difícil de lidar quando elas retornam para sua vida cotidiana.
Nielson ouviu histórias de pessoas que saíram desses retiros com experiências que mudaram suas vidas também. Mas ela liga isso a ir a uma feira e comprar remédios caseiros de ervas para alguma coisa. Pode funcionar ou não, mas ainda é algo não regulado. “[Retiros] podem não estar fazendo nada ilegal, mas também não estão trabalhando dentro das estruturas do sistema de saúde mental existente, o que é muito diferente”, disse Nielson. “Acho que muita gente não entende isso.”
Muitos médicos estão sendo abordados por seus pacientes com questões, disse Nielson. “Eles estão sendo procurados como autoridades nesse tópico porque é saúde mental”, ela disse. “Mas não há muito treinamento formal ou educação continuada onde eles podem procurar respostas.” Para esse fim, ela recentemente ajudou a desenvolver um programa para médicos aprenderem sobre redução de danos e integração em práticas clínicas com relação a psicodélicos.
Uma questão é o preço. Se cada retiro empregasse profissionais de saúde licenciados, isso custaria “tipo umas 10 mil libras ou algo assim”, disse Watts. “Vamos ter que, em algum ponto, pensar: Qual o enquadramento de segurança mínimo e efetivo para as pessoas?” Outra questão é que só porque alguém é um terapeuta treinado, não significa que ele tem a experiência sobre como ajudar as pessoas a passar, ou lidar, com uma viagem psicodélica.
Vaid foi para o Synthesis para ver quais outros enquadramentos para cuidado psicodélico eles tinham. Ela me disse que ficou impressionada com nossos três dias, mesmo que seja algo muito diferente da prática dela – ela trabalha com doses muito menores de ketamina, que são personalizadas para cada paciente.
O cenário dela é muito mais como uma sessão de terapia. O Synthesis é mais espiritual, incluindo componentes como meditação, trabalho de respiração e trabalho corporal. Ter uma experiência mística, segundo pesquisas, prevê um resultado positivo da droga, mas não se sabe quando disso se dá pelo cenário em si. Não sou uma pessoa espiritual, pelo menos no sentido tradicional. Encontro significados ricos em emoções humanas, psicologia, arte, música, química, biologia e natureza. Mas coisas como cristais, energia, entidades e espíritos não me afetam, e então quando Adam colocou as mãos sobre mim, tentando me acalmar com reiki, não me senti neutra, mas hostil – como uma afronta às minhas crenças pessoais.
Como minha experiência foi tão focada nas mulheres da minha família, descobri que eu podia me sentar apenas com uma mulher. Valerie era a única facilitadora mulher durante a minha semana no Synthesis. Johnson disse que a maioria dos testes de pesquisa incluem um homem e uma mulher com cada paciente, porque eles aprenderam como a diversidade é importante em apoiar pessoas revivendo diferentes tipos de trauma.
Não me senti cheia de alegria, não saí da minha viagem com uma conexão mais profunda com o universo.
Katz, o cofundador do Synthesis, e eu tivemos uma conversa sobre minha experiência e compartilhei com ele alguns desses pensamentos. Ele foi receptivo, e disse que sabe que retiros ainda são um trabalho em progresso. Ele disse que agora eles estão tentando personificar as doses, e oferecendo retiros só para mulheres com facilitadoras mulheres. E eles geralmente tentam ter um equilíbrio de gêneros – no meu final de semana, o grupo deveria ser liderado por uma mulher chamada Nataja, mas ela ficou doente. Enquanto a base de clientes deles continua crescendo, eles estão com mais dificuldade para encontrar facilitadores, disse Katz, No momento, eles diminuíram o número de clientes que estão aceitando para contratar e treinar mais pessoal. “Esse foi um exemplo de como não estávamos equipados para ser flexíveis quando alguém cancela no último minuto”, ele disse.
O Synthesis acabou de atender seu 500º cliente, o que é algumas centenas a mais que alguns testes clínicos. “Ao mesmo tempo”, disse Katz, “são apenas 500 pessoas”. As pesquisas ainda não conseguiram prever o que faz uma viagem ir numa direção para uma pessoa, e numa direção diferente para outra.
“Somos apenas uma organização trabalhando com um método em particular usando psilocibina”, disse Katz. “E estamos fazendo o melhor possível para garantir a segurança médica e as melhores práticas, que ajudem em decisões movidas por dados que vão aperfeiçoar as coisas.”
Em novembro, o Synthesis anunciou que Robin Carhart-Harris, chefe do Centro de Pesquisas Psicodélicas do Imperial College London, se juntaria a seu painel de consultores. É a continuação de uma colaboração que já existe entre os dois grupos – o Synthesis fornece dados para o Estudo de Cerimônia do Imperial, que rastreia o uso cerimonial de psicodélicos. Mas Katz espera que a presença de Carhart-Harris os ajude a melhorar o processo de triagem, como eles apoiam os clientes, e talvez usar dados para tentar prever que tipo de experiência uma pessoa pode ter e ter o tipo certo de apoio preparado. “Poder operar legalmente com psilocibina é uma vantagem única para o Synthesis, e acredito que há mais potencial do que simplesmente um negócio de retiros que começamos”, disse Katz.
Perguntei se ele achava que, através de sua aliança com o Imperial College e sua dedicação em seguir as melhores práticas, eles podem atrair especificamente o tipo de pessoa que precisa de mais apoio, como eu – pessoas que eles não estão necessariamente equipados para ajudar.
Katz disse que é possível, e essa é uma posição difícil pra se estar. Ele sabe que quando o Synthesis rejeita alguém, a pessoa provavelmente vai procurar outro retiro. “Esse não é um bom cenário, porque estamos basicamente dizendo que não é seguro, e a pessoa responde ‘Não me importo, essas outras pessoas vão me aceitar’”, ele disse.
“Tem muito mais coisas que não sabemos do que coisa que sabemos”, disse Katz. “Isso pode soar pesado, mas é basicamente tentativa e erro, e crescimento. Dizer, OK, isso não funciona. Vamos tentar outra coisa.”
Eu estava interessada em tomar cogumelos porque isso parecia como “resetar” seu cérebro. Watts disse que essa noção agora infame vem de uma citação de uma entrevista que ela fez com um participante, que foi pega pela mídia. Enquanto isso pareceu verdade para aquela pessoa, ela diz que as pessoas podem ficar excitadas demais com a metáfora. Nas triagens deles, muitas pessoas fazem referência a esse sentimento, dizendo a Watts que elas querem dar um reboot no cérebro. Pessoas com essa expectativa podem resistir a entrar em emoções difíceis durante suas viagens, porque acham que vai haver um “reset” sem esforço.
O que geralmente fica faltando nas matérias sobre saúde com psicodélicos que lemos, é que psicodélicos são uma ferramenta. Elas facilitam o trabalho psicológico, mas isso ainda é trabalho – trabalho que nem sempre é fácil ou divertido, e pode ser muito doloroso.
“Esse é um processo terapêutico intenso”, disse Watts. “Isso é uma jornada nas partes mais profundas do seu ser e pode ser muito desafiador. Acho que na mensagem cercando psicodélicos, seria útil mudar isso um pouco.”
O que geralmente fica faltando nas matérias sobre saúde com psicodélicos que lemos, é que psicodélicos são uma ferramenta. Eles facilitam o trabalho psicológico, mas isso ainda é trabalho – trabalho que nem sempre é fácil ou divertido, e pode ser muito doloroso.
Talvez para alguns essas viagens sejam como um reset. Mas aposto que para outros, como eu e Gemma, não é tão simples como arrancar um bandaid.
“Eu queria que meu tempo fosse explicado pra mim um pouco mais”, disse Gemma. “Sei que você não deve comparar sua jornada com a dos outros, mas fiquei pensando: outra pessoa teve uma situação como essa? Sou a única pessoa que passou por esse retiro e fiz isso, ou é algo comum? Você se questiona muito quando vai embora. Todo mundo diz que essa é a coisa mais incrível da vida deles. E você pensa ‘Meu deus. Tem alguma coisa realmente errada comigo agora?’” Johnson disse que, na verdade, isso é comum: pessoas se culpam e acham que estragaram sua experiência.
Não acho que podemos culpar indivíduos por não ter uma boa experiência, ou apontá-los por “não se soltar” ou “se render” como a única coisa que deu errado. “Da minha experiência como psiquiatra e psicoanalista, é muito difícil mudar nossa personalidade e mudar nossa mente, mesmo quando você está motivado e tem intenção de fazer isso”, disse Vaid. “Psicodélicos não são uma pílula mágica pra isso. É um processo onde você pode ganhar insight. Mas a maioria de nós sabe que quando você tem insights e um grande momento ‘Ahá’, quanto disso realmente se traduz para mudança real é algo limitado.”
Vaid acha que a parte relacionamento da terapia com psicodélicos não é muito discutida. Muitas das propagandas para os retiros focam em como tomar essas drogas é uma oportunidade de mudar sua mente, incluindo termos “científicos” como “desativação do modo de rede padrão”, ou “neuroplasticidade”. Mas “a parte do relacionamento e terapia não é menos significativa que a droga em si”, disse Vaid.
Imagino como minha experiência teria sido se eu tivesse uma pessoa dedicada sentada comigo, como num estudo médico. Watts considera ter uma mão para segurar o mínimo para trabalho psicodélicos. E se eu não tivesse que me preocupar que a Valerie tinha outras pessoas para tomar conta?
“Precisar do apoio de alguém e não ter isso pode ser como um tipo de repetição das feridas primárias da infância”, disse Watts. “Essa é outra razão para termos um terapeuta homem e uma terapeuta mulher, porque é uma situação reparadora para pessoas que não tiveram uma mãe ou pai amoroso com elas por toda a infância. Todos desejamos isso. De certa maneira, isso é quase como um exercício de mini-família.”
Pensando agora, o que experimentei foi profundo. Falei sobre a minha mãe e sua história na terapia antes, mas não com o sentimento profundo que ocorreu durante minha viagem com psilocibina. Consegui, sem julgamento, mergulhar nessas emoções de um jeito como nunca fiz antes. Teve momentos em que chorei histericamente e fiquei sem ar, e eu não choro na frente de outras pessoas. Sou muito cuidadosa para controlar meu comportamento com os outros, e lá estava eu, na frente de estranhos, realmente me soltando.
Não sei se tive algum efeito duradouro da minha viagem. Desde então, me debrucei sobre os temas que surgiram pra mim, especialmente sobre cuidado e abandono, mais do que eu faria de outra maneira. Mas não de jeitos que parecem necessariamente produtivos ou de cura – é mais como uma ferida que reabriu.
Não me senti cheia de alegria, não saí da minha viagem com uma conexão mais profunda com o universo. Se eu tivesse que resumir minha conclusão numa frase, seria que a vida é cheia de sofrimento, e que somos obrigados a sacrificar nossa suavidade para ter força para encarar esse sofrimento. Estou curiosa se minha conclusão teria sido diferente com mais apoio.
Não sei se vou tomar psicodélicos de novo. Não descarto a possibilidade. Aprendi muito sobre o tipo de apoio que posso precisar se fizer isso de novo num contexto terapêutico, e sobre partes de mim, da minha família, e do meu passado que podem ser poços mais fundos de dor do que eu imaginava.
Enquanto retiros psicodélicos aumentam em número, será fundamental para eles reconhecer as experiências que não envolvem visuais bonitos e revelações estilo “o amor é universal”. Pessoas com condições de saúde mental e pessoas com traumas podem ter jornadas diferentes usando psicodélicos. Se só falamos sobre as experiências boas, há menos espaço para a ideia de que experiências difíceis podem ser transformadoras também, com o apoio e integração apropriados. O enquadramento clínico parece permitir isso, e esperar isso. É quase certo que as pessoas vão experimentar coisas difíceis. A questão é se pessoas que não são profissionais de saúde vão descobrir como torná-las válidas.
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