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Música

O perigo voltou ao Cais

Os Dope Body estreiam-se em Portugal com concerto histórico no Sabotage. Perigo, suor e rock, directamente de Baltimore, USA.

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Fotografia cedida pelo autor.

É quinta-feira, a noite arranca tranquila no Cais do Sodré, mas há um cheiro a perigo no ar. Não exactamente aquela sensação de transgressão que se entranhava na pele quando a rua ainda não era cor-de-rosa, o Transmission ainda não era um requintado wine bar, e o strip no Vicking não fazia parte do roteiro Time Out para despedidas de solteira betas. Ainda assim, perigo.

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Há rock n' roll prestes a subir ao palco do Sabotage. Rock de Baltimore, carregado de boas referências lidas em sites, blogs e afins, coberto de subgéneros que vão do noise, ao grunge (sim, ao grunge), ao psicadélico, ao garage, ou até àquele inventado pelos Pixies e que, por si só, é todo um tratado de cruzamentos, infiltrações e adjectivos. Depois há Fugazi, há. Mas também há o balanço dos Helmet e isso não é coisa de somenos.

Fotografia cedida pelo autor.

Se só isto já chegaria para levantar alertas vermelhos da Protecção Civil, no momento em que o quarteto norte-americano liga os amplificadores e o som (excelente som o do Sabotage) a sala lisboeta percebe que não só há perigo, como há história a acontecer. Os Dope Body são jovens, rápidos, furiosos, suados e urgentes. Vêm dos subúrbios de uma capital e isso nota-se. Dos subúrbios da capital norte-americana e isso é ainda mais óbvio. Os seus palcos são como este da estreia em território português. Os sítios onde tocam, seja nos arredores de Washington DC - porque na cidade mesmo, diria mais tarde à VICE o vocalista Andrew Laumann, raramente actuam - ou na Europa, são pequenos, fumarentos, quentes, e, por isso, acolhedores e capazes de absorver a vibração electrizante dos Dope Body.

Na segunda música já Laumann está de tronco nú e canta no meio do público. Da guitarra, do baixo e da bateria saem malhas tensas, intensas, drogadas quanto baste, pesadas, mas quase sempre carregadas de um balanço, um swing que as mantém no sítio e nos faz a nós abanar a anca, e ao vocalista o corpo todo. Há tanto de Iggy, como de Mick, como de Jim neste rapaz. É óbvio e se calhar demasiado referencial, mas inevitável. Não vale a pena obscurantizar as referências, porque o que a música dos Dope Body nos traz neste antro de bom gosto lisboeta é fresco e inspirador. Pode cheirar a noventas por todo o lado, mas está tão carregado de sentimento que nem sequer é velho tornado novo. É só novo.

Fotografia cedida pelo autor.

Da estreia dos Dope Body em Portugal, naquele que foi um evento produzido pela Nariz Entupido, rezará a história…num capítulo dedicado a sangue, suor e rock, mas, é bom que ninguém se esqueça, antes dos de Baltimore já Acid Acid, projecto musical do radialista Tiago Castro, tinha metido toda a gente numa bolha psicadélica e feito a viagem Cais do Sodré-Marte-Cais do Sodré, com paragens em Pompeia, África, Manchester, Detroit e dois ou três apeadeiros desconhecidos. Guitarra, sintetizadores, pedais, arco de violino e uma composição contínua que não precisa de palavras para nos entrar na cabeça e no corpo, nem de permissão para criar paisagens, cenários de aridez gélida ou ardente, grandes planos de histórias de amor e perda.

Ainda há perigo no Cais!