Este artigo foi originalmente publicado na VICE Espanha.
O Primavera Sound de Barcelona deste ano tinha pela frente uma tarefa bastante complicada: fazer com que o “New Normal” passasse de um slogan a uma realidade factual. Ou seja, que a maioria dos milhares de pessoas que assistiram ao Festival (digo maioria porque, ao fim e ao cabo ,nunca é tudo ao gosto de todos e vai sempre haver quem prefira um festival purista, seja lá o que for que isso signifique) não se chocasse por ir de Princess Nokia a Mac DeMarco na quinta-feira, de Jawbreaker a Miley Cyrus e dali a Lisabö na sexta-feira e, no sábado, sem mudar de cenário, ver Rosalía e J Balvin, ir a uma ponta ver DJ Playero e acabar a ver Mujeres a tocar covers de Los Saicos.
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Quando há uns anos fui com a minha mãe aos concertos grátis de quarta-feira à tarde para fazer um directo para o Facebook da VICE, ela não conhecia nenhum dos artistas do cartaz. Não sabia sequer que o festival existia. Este ano, pelo contrário, foi a minha mãe quem me avisou de que entre os cabeças de cartaz estavam Rosalía e J Balvin e acho que seria impossível ocorrer-me melhor metáfora do que significa esta “nova normalidade”.
E não por a minha mãe ser o público-alvo do Primavera Sound, mas porque reflecte que a mudança de visão que o Festival tem sobre si próprio não é só uma espécie de wishful thinking dedicado a sacar manchetes e a fazer com que o núcleo duro do indie (mais uma vez, seja o que for que isso signifique) brade aos céus, mas também uma realidade patente. Tão patente como ser uma das poucas vezes que a minha mãe sabe de quem falo quando lhe digo que vou a um concerto.
Até o facto de anunciarem que os Pavement serão um dos cabeças de cartaz da próxima edição [em Barcelona e no Porto, como as duas únicas datas de uma reunião há muito esperada], mesmo antes de começar o concerto de Rosalía (uma artista que, por outro lado, também representa essa mesma ideia) reflecte essa vontade de tornar realidade a visão que, agora, o Festival tem de si mesmo.
Por outro lado, este ano a forma de distribuir o line up pelos diferentes palcos e os novos palcos na praia de Sant Adrià, a zona do outro lado da ponte que divide o recinto do Parc del Fòrum, contribuíram para a sensação de estar num festival muito mais homogéneo do que, a priori, os géneros dos artistas nos fariam pensar. Até num palco mais ou menos temático como o El Punto não dava a sensação de se estar a sair do festival, como talvez acontecesse em edições anteriores nas que essa zona parecia estar reservada à musica electrónica e afastada do que se passava dentro do recinto.
Uma mudança que se nota no público, tão diverso como o cartaz e que não parou de dar tudo durante todo o Festival, desde os concertos em salas da cidade na segunda e terça-feira, até aos de ontem, domingo, que puseram o ponto final e oficial ao Primavera de 2019. Ao fim e ao cabo, uma sociedade na qual os limites são líquidos, na que “tudo o que é sólido se desvanesce em ar”, a música é só mais uma forma pela qual isto se manifesta – e quem não percebe isso, pior para ele.
Abaixo podes ver mais fotografias da edição deste ano do Primavera Sound de Barcelona.
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