Desde que a redes sociais começaram a minerar nossos dados, os usuários são encorajados a ser cuidadosos com o que postam na internet. Como informado pelo Independent, um estudo de 2018 mostrou que seis em cada 10 britânicos se arrependem de algo que postaram online, com 47% desejando poder deletar aspectos de seu passado digital.
Enquanto millennials, em teoria, tinham idade suficiente para usar as redes sociais com responsabilidade logo no começo, e que a Gen Z leva a privacidade na internet mais a sério que as gerações anteriores, os presos no meio disso – chamados de geração “zillennial” por alguns – agora enfrentam as repercussões de ter crescido publicando sua vida inteira na internet.
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Zillennials – quem nasceu entre 1993 e 1998 – tinham entre 8 e 13 anos quando o Facebook começou a pegar no Reino Unido. Velhos o suficiente para perder a possibilidade de ter uma propriedade, mas jovens o suficiente para usar respeitosamente o TikTok e saber vagamente o que é uma e-girl, zillennials tiveram acesso às redes sociais mainstream de hoje (ou seja, não os defuntos MySpace ou Orkut) a partir dos 10 anos de idade. Mesmo que o Facebook só seja aberto para maiores de 13 anos, eles só precisavam de um e-mail válido e mentir a idade para fazer uma conta.
Tommy*, 23 anos, sente uma ansiedade constante quando pensa no conteúdo que postou em seu Facebook, acreditando que essas coisas vão voltar para assombrá-lo num futuro próximo. Esse zillennial é um formado em política de Leeds que tem uma carreira promissora como repórter político, e pensa em se candidatar como parlamentar no futuro.
Ele entrou no Facebook aos 13 anos e passou meia décadas publicando fotos e vídeos que mostravam ele usando vários tipos de drogas, incluindo cocaína, cogumelos, MDMA e maconha. Tommy postou e tagueou fotos que o mostravam orgulhosamente doidão, zoando muito em sua tranquila cidade natal e se envolvendo em pequenos vandalismos infantis.
“Parte disso pode ser considerado ‘coisa de moleque’, mas alguns dos vandalismos e piadas ofensivas definitivamente não parecem bons, não importa a idade que você tenha”, ele diz.
Ele está considerando cortar suas perdas e simplesmente deletar sua conta no Facebook, mas, com ele me disse, “se muito desse conteúdo outras pessoas postaram ou mandei para alguém no Messenger, não acho que deletar o Facebook e me destaguear vai sumir com essas imagens. Pode ser mais difícil para um possível empregador encontrar algo em que fui tagueado, mas se alguém quer achar alguma sujeira sobre mim, acho que não seria muito difícil”.
Quando falando sobre um certo infame ministro Tory que admitiu ter cheirado cocaína na juventude, Tommy reconhece que não poder controlar a narrativa na sua situação o coloca em desvantagem comparado com os políticos de hoje: “É OK dizer ‘Experimentei cocaína numa festa uma vez, odiei e nunca mais usei’, mas se há centenas de imagens no Facebook de você cheirando cocaína, não é fácil dizer ‘ah, sim, nunca gostei de verdade e nunca mais toquei nisso’”.
Alex*, 24 anos, de Londres, entrou no Facebook e YouTube com 10 anos. Quando tinha 12, ele e seus amigos filmaram um curta caseiro feito no parque local onde imitavam um comercial ofensivo. Desde então, Alex sente uma ansiedade subjacente constante de que o vídeo possa ofender pessoas e afetar sua reputação no futuro.
Como eles perderam o acesso ao endereço de e-mail usado para fazer a conta, os envolvidos não podem resetar a senha e remover o vídeo. Além disso, quando o Google comprou o YouTube em 2006, os usuários passaram a ter que reclamar contas de “legado”, o que só pode ser feito dando o nome de usuário e a senha originais da conta.
Para quem está lendo e mentalmente catalogando todas as merdas que postou online, infelizmente não há muito o que fazer. Jo O’Reilly, uma especialista em privacidade digital da ProPrivacy, me disse que “quando a informação foi dada, é muito difícil guardá-la de volta”. Ela disse que é importante que os jovens sejam educados sobre os riscos de compartilhar coisas online antes que seja tarde demais.
Para quem não pode voltar para 2007 e ter uma conversa séria com seu eu mais novo, Jo sugere trancar todas as contas usando configurações de privacidade e conferir regularmente a página de “Memórias” do Facebook no seu navegador ou aplicativo, e deletar conteúdo constrangedor quando você achar necessário. Ela também sugere fazer uma busca por palavras controversas nos seus tuítes antigos e apagá-los.
Esperando fazer uma carreira na música, meu amigo zillennial Liam* fez exatamente isso, dedicando umas quatro horas um dia para apagar conteúdo questionável de sua presença online. “Passei por todos os meus tuítes e deletei uns 80%, aí fiz uma busca com meu nome de usuário e uma seleção de palavras que já usei mas não me sinto confortável em usar hoje.” Ele trocou seu nome no Facebook por um apelido, garantindo que empregadores em seu setor atual não o encontrem facilmente.
Para quem não tem tempo de fazer o trabalho demorado de peneirar todo seu histórico na internet, o aplicativo beta Hey Clear promete fazer o expurgo por você, mas Tommy tem dúvidas sobre as capacidades técnicas de serviços desse tipo: “Você pode não conseguir passar pelo meu feed no Facebook e achar esse conteúdo, mas quem pode dizer que um investigador particular não consegue?”
Mesmo esperando remover seu vídeo do YouTube um dia, Alex considera apagar toda sua presença nas redes sociais algo problemático. “É como colocar um óculos cor-de-rosa na sua vida. Isso é ignorância, sabe? É como se esconder do que está acontecendo no mundo para não ter que encarar o que você pode fazer para torná-lo um lugar melhor.”
Para Tommy, Alex e Liam, o conteúdo que eles escolheram publicar com os anos causou mais dor de cabeça do que valeu a pena. Enquanto os adolescentes de hoje usam a função de amigos próximos do Instagram e protegem com cuidado suas stories no Snapchat, os futuros políticos, artistas e músicos zillennials provavelmente vão encarar um questionamento inevitável vindo de fotos antigas e status polêmicos no Facebook. É só outra coisa para esperar do nosso futuro já incerto.
*Os nomes foram mudados para proteger os entrevistados.
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