Sexo e loucura: fotos da versão real do filme “A Praia”

Este artigo foi originalmente publicado na VICE Alemanha.

Em 2015, a fotógrafa Rebbeca Rütten passou três meses num hostel de localização secreta, numa ilha tropical, onde um grupo de viajantes encontrou a sua própria utopia. Rebecca documentou os excessos diários destes semi-despidos e auto-proclamados espíritos livres, oriundos predominantemente de países ocidentais e suficientemente privilegiados para serem capazes de escapar à vida normal durante meses seguidos.

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Rütten tentou manter uma distância objectiva enquanto fotógrafa, mas, obviamente, também não queria perder a festa. A única forma de se aproximar do que queria captar foi tornando-se parte deste grupo de hedonistas que tentam encontrar o significado da vida a jogarem jogos de bebida e a pinarem uns com os outros.

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Estes meses de experiência resultaram agora num livro chamado Never-Never Land, que começa com imagens idílicas de uma floresta tropical virgem e um porco a banhar-se no mar. De seguida, há duas pessoas de rabo virado para a câmera com as tatuagens acabadas de fazer e onde pode ler-se “POR QUÉ NO?” (“PORQUE NÃO?). Rebecca é vaga no que diz respeito à localização exacta do hostel, porque quer proteger o local de uma invasão de visitantes. Falei com ela sobre o que a levou a fazer este projecto.

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VICE: O teu livro evoca um bocado o sentimento do filme “A Praia”, entre o paraíso e a claustrofobia, rodeada de um ambiente idílico. Tiveste alguma preocupação antes de viajar para o local?
Rebecca Rütten: Na realidade não. Já lá tinha estado uns dias em Janeiro de 2014 e tinha boas recordações. Andava sempre toda a gente vestida com máscaras, a música era boa e o ambiente era muito comunitário. Era tudo bastante intenso e as pessoas muito interessantes. Mas é certo que naquela altura questionei-me sobre o consumo excessivo de álcool. Never-Never Land acabou por ser uma experiência para mim. Queria perceber se era mesmo um estilo de vida tão despreocupado como parecia ser.

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Rebecca

Ao ler os apontamentos do teu diário nota-se claramente a proximidade com a comunidade. Houve algum momento em que te sentiste totalmente integrada no grupo?
Aceitaram-me logo, mas eu sempre deixei muito claro que estava ali para levar a cabo um projecto fotográfico. Por um lado sentia-me parte do grupo, por outro não. Com o tempo foi sendo cada vez mais difícil manter algum distanciamento, porque a Internet só funcionava às vezes e quase nunca podia contactar a minha família e os meus amigos.

Muitos dos que para lá vão ficam durante muito tempo. Acabas por procurar dar-te com gente em quem possas confiar, já que estás numa situação de isolamento, que contribui para a sensação de claustrofobia. Os sentimentos de pertença e de identidade desempenham um papel muito importante, bem como a participação nos rituais de bebida. A sexualidade também estava sempre omnipresente: embora todos tivessem pessoas nas usas vidas normais, ali dormiam com outras pessoas.

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Como é que conseguiste captar tantas imagens, apesar de nem sempre conseguires estar sóbria tu própria?
Bem, andava sempre com uma máquina pequena no saco. Era difícil trabalhar, porque também queria desfrutar dos momentos, queria fazer parte daquilo.

No início estava muito motivada, mas quando comecei a sentir que o padrão se repetia, acabei por deixar essa parte de só diversão de lado. Via cada vez mais gente que não estava a passar bem e que andava a maior parte do tempo meio aluada, sem se aperceber de nada à sua volta. Parece-se muito com o ambiente nos clubes de Berlim, com tanta droga. As pessoas perdem a cabeça.

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O hostel parece estar situado no meio da selva…
Está numa ilha muito tropical e carregada de escorpiões, papagaios e macacos. Cheguei a pisar uma Boa Constrictor. Também havia muitos animais de estimação. O cenário era incrível. um monte de gente jovem, vestida de Peter Pan e rodeada de animais. Mas tudo isto acaba por ter um lado perigoso.

Havia gente que quando se embebedava tentava importunar os animais e acabava mal. E estávamos no meio do nada, ou seja, não é que houvesse ali um hospital à mão. A única hipótese era encherem-se de analgésicos e esperar que a dor passasse.

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Os que lá estavam há mais tempo achavam que eram uma espécie de “Os Escolhidos”?
Há até alguns que acham que se distanciaram das pessoas “normais”. Em parte entendo, porque entras numa série de situações e relações muito estranhas. Mas aquilo não é a realidade e até esses “escolhidos” em algum momento vão regressar ao mundo. O que fazem é fugir aos seus problemas, enquanto estes se tornam cada vez maiores.

Muitos deles regressam a suas casas apenas pelo tempo suficiente para juntarem mais dinheiro e poderem voltar. Quando saem de lá levam uma chapada de realidade de que não estão à espera. Mas acho que, melhor, ou pior, todos acabam por conseguir voltar a adaptar-se.

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Nas comunas é normal que alguém se proclame como líder do grupo. Passa-se o mesmo ali?
Eu vejo-o como uma peça de teatro. Quando o elenco não é adequado, cada um assume o papel do seu próprio drama. Quem ali está quer fugir das regras sociais, mas, ironicamente, acabam por criar também um sistema. Nesse processo de tentarem gerar uma utopia anárquica, acabam por regressar aos padrões de comportamento social de sempre. No livro também coloco a questão de até onde podem as pessoas chegar para viverem a sua liberdade sem acabarem por se prejudicar. Para além das viagens, os excessos são, para muitos, outra forma de escape e, se calhar, de forma moderada pode ser bom, mas ali era demasiado.

A tua opinião sobre esta forma de viajar mudou depois desta experiência?
Fez-me pensar no porquê de quem tenta criar este género de utopias em países em desenvolvimento serem sempre jovens brancos de classe média e que nunca incluem nos seus planos os autóctones. Porque é que escolhem sempre países com debilidades políticas? Porque é que só escolhem locais onde faz sempre bom temp? Porque é que ninguém os incomoda? Antes, viajar só de mochila era a minha religião, o único modo autêntico de viver a vida, mas agora sou mais crítica. Aprendi a apreciar o conceito de lar e aprendi que as tuas raízes e a reflexão são elementos necessários à tua vida.

Actualmente procuro mais interagir com pessoas e tentar entender coisas que ainda não compreendo. Quero sair da minha bolha, porque este hostel, por exemplo, é uma bolha em que tudo o que sirva para te distrair e entreter é bem-vindo, enquanto tudo o que te coloque questões é rejeitado.

Podes ver mais trabalhos de Rebecca aqui, ou no Instagram.

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