A internet sempre teve um papel muito importante quando falamos sobre desconstrução social e ideológica. O grande problema da história toda é que a ideia de fazer isso através dos famosos “textões” ou mesmo por meio de eventos que pretendem promover debates políticos mais profundos já não toca as pessoas como deveria. A dança, foi o caminho mais divertido, sensual e fitness, no melhor estilo “unir o útil ao agradável”, que um grupo de meninas encontrou para ajudar outras minas a se identificarem e conhecerem o poder do corpo da mulher.
Foto: Laura Viana
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“A gente estava literalmente fazendo faxina quando a ideia surgiu. Começou a tocar “Work” da Rihanna e começamos a dançar. Uma foi mostrando o passo para a outra e foi aí que tivemos a ideia de juntar as amigas pra uma ir ensinando a outra”, conta Ane Sarinara, uma das organizadoras do “Twerk das Minas”, aula gratuita de twerk que aconteceu no último final de semana no coração do CRUSP, o Conjunto Residencial da Universidade de São Paulo, no Butantã, na zona oeste de São Paulo.
O “twerk” é um estilo de dança em que quase todos os movimentos se concentram em remexer os quadris. Nele, é possível encontrar traços de diversos outros estilos como a lambada, o funk e ragga jam. “A princípio não tínhamos a ideia de agregar outras pessoas que não conhecemos na aula”, explicou Ane. A procura foi tanta que as organizadoras tiveram que dividir os horários e realizar inscrições online para conseguir atender democraticamente às interessadas.
A ideia era que o evento tivesse 10 ou no máximo 15 pessoas confirmadas, por isso as meninas que estavam organizando se assustaram quando mais de 600 minas demonstraram o interesse em participar da aula pra rebolar a bunda. “Nós não esperávamos toda essa procura, e isso foi um pouquinho assustador”, comentou Ane.
Quase 100 minas negras, indígenas e brancas resolveram se dividir em dois horários de aula, que tiveram a duração de 1h30 cada e usar um pedacinho da sala 51, conhecida como CRUSPAMOR, para aprender um pouco e compartilhar novas técnicas ou passos de dança. No começo um pouco tímidas, mas já na primeira batida — e com a ajuda das organizadoras, que estavam com todo o gás — elas rebolaram, requebraram, suaram seus shorts, deitaram no chão e riram muito.
“Eu fiquei sabendo através de um coletivo que eu participo. Eu amei! Ver as pretas, aprender mexer o bumbum. A gente precisa entender que o nosso corpo é bonito, que não é um objeto”, conta a estudante de Gerontologia na USP, Beatriz (19). “Nós não vamos dançar para seduzir ninguém, a gente dança pra se sentir bem, se sentir feliz. Momentos como esse são muito interessantes, nós vamos sair aqui com uma energia diferente”, conclui Beatriz.
Do lado de fora da sala, a música alta chamava atenção dos curiosos que às vezes colocavam a cabeça dentro do lugar para dar uma olhadinha. “Eu nunca tinha parado pra pensar nisso da dança, porque eu sempre quero me desconstruir através de textos e através do intelecto. E pensar nisso agora é incrível”, conta a estudante de jornalismo na USP, Nairim, 20. Essa desconstrução da desconstrução é um sentimento comum também entre as minas que tiveram a ideia da aula. “Essa dança liberou muita coisa no meu corpo, no sentido de me deixar sensual, de me ver mais bonita, de me ver sem essa vergonha que o mundo traz para o corpo da mulher”, afirma Lê Nor, outra organizadora do evento.
Ao final de cada aula, as organizadoras chamavam as minas para sentar em roda e contar o que acharam como uma espécie de feedback em tempo real. Os corpos ainda quentes ferveram em várias discussões sobre o empoderamento do corpo feminino e do corpo negro e sobre o espaço e o direito da mulher na dança. A mulherada se emocionou ao contar como a experiência conseguiu ser libertadora, como explica Ane: “Uma coisa que a dança traz é isso, uma segurança corporal e também uma autoestima. A estima é algo muito frágil e a dança consegue trazer isso de volta. E você ter o controle do corpo é fantástico. Tudo ali está sob o seu controle.”
As aulas foram um sucesso visível e já rola um burburinho de uma possível segunda edição em breve. A única certeza que nós temos é que todas ali vão querer colar de novo e continuar ralando o bumbum no chão. “Foi muito emocionante isso pra mim. Se rolar de novo eu venho com certeza”, afirma a estudante de Física da USP, Lorraine, 20.
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Saca só o Twerk das Minas: