Segundo a Relatório Global de Drogas, um em cada quatro britânicos compra suas drogas na deep web. Apesar do método moderno para compra-las, a maior parte dessas drogas ainda é usada do jeito tradicional: às 9 da noite num banheiro de bar, ou às 5 da manhã na capa de um DVD de Duro de Matar. Mas outro método de usar drogas emergiu graças a esse mercado online: pessoas que consomem cocaína como o Paul Giamatti experimenta vinhos em Sideways, ou como gente fresca que bebe uma cerveja IPA nesses bares gourmet.
Eles são os connoisseurs de cocaína da Inglaterra, um grupo em crescimento de homens (na maioria) que se orgulha de saber mais sobre padê que você.
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Na verdade, depois de observá-los por meses, acredito que o jeito único deles de usar cocaína é um sintoma da “gourmetização do pó”. Mas seu suposto conhecimento superior os protege da exploração dos traficantes, ou os deixa mais suscetíveis a pagar mais caro por qualquer porcaria por aí?
Um lugar onde esses especialistas se reúnem é um fórum criado quando uma matéria que escrevi em janeiro levou o Reddit a derrubar o antigo lar da comunidade, o r/DNMUK, onde drogas eram vendidas.
Acontece que o substituto é muito melhor – mais preocupado em manter todo mundo seguro que deixar a galera cheiradona. Então, apesar deles me chamarem de arrombado, corno e retardado, não vou dar o nome desse fórum para evitar expor totalmente os seus usuários (e a mim mesmo).

A primeira coisa que notei navegando pelo fórum é como os usuários descrevem a cocaína (ou flocos, como a maioria prefere) em termos geralmente reservado para discos do Chat Baker. Aqui, um cara chama um lote de “descolado e elegante”, antes de provavelmente acender um Gitanes numa sala com iluminação suave.
O fórum também tem seu próprio vernáculo, que parece ter se desenvolvido nesse curto período de existência – uma variedade de termos e gírias para descrever o processo de cheirar.

Apesar de o papelote do cara acima ter cheiro de massala, as duas palavras que os usuários do fórum geralmente usam para descrever o cheiro da cocaína são “gasolina” e “orgânico”. Gasolina significa que o produto não foi limpo dos químicos usados no processo de fabricação, indicando um lote inferior de um produtor descuidado, enquanto orgânico significa combustível de foguete tipo A.

“Bag appeal” significa que o papelote tem um visual legal – basicamente, como ele sai em fotos para os outros connoisseurs, com e sem flash. A isso se mistura uma conversa sobre textura, com “macio” e “oleoso” frequentemente significando algo bom, e “quebradiço” considerado um sinal de que o produto foi cortado com outra coisa, ou cocaína “batizada”.

Se você quer ver um cheirado fresco em ação, esse outro cara chama o gosto da cocaína dele de “terroso” e “salgadinho”.

Uma razão para drogas servirem como tema de tantos romances é porque seus efeitos permitem que os escritores misturem sonho e realidade, e criem um estado quase que de transe em seus leitores. Algumas coisas escritas por esses connoisseurs têm uma vibe similar, mesmo que dificilmente vá reder algum prêmio literário. Como o cara acima, que descreve os efeitos desagradáveis da cocaína como tendo um certo tipo de beleza. Imagine você, falar sobre os efeitos da cocaína inevitavelmente acaba com alguns jargões sendo usados:
Essa cocaína é “eufórica” ou “estimulante”, “suave” ou “forte”, e é do tipo “ficar sentado em casa”? Ela tem “pernas”, significando quanto tempo preciso esperar para cheirar outra carreira? Então é meio decepcionante quando a conversa baixa para um nível de cheirador domingueiro comum.

O que sempre acontece quando o assunto é sexo ou cocô.

Para esses caras, a cocaína se torna gourmet no processo de preparação. Hot-plating – colocar o pó numa superfície morna para remover a umidade – é o mínimo que você pode esperar de um connoisseur, enquanto lavar a cocaína com acetona – um experimento elaborado, mas possível de se fazer em casa – é o próximo nível.

O objetivo da lavagem com acetona é remover adulterantes, te deixando – como o cara acima diz – com cocaína pura. Essa história começou em 1981, quando David Lee escreveu Cocaine Handbook: An Essential Reference – mas nunca realmente pegou. Graças à deep web do Reino Unido, onde isso se tornou popular nos últimos meses, agora um traficante está vendendo flocos pré-lavados para te poupar o trabalho.

Incrivelmente, quando se trata do uso hardcore de cocaína, as coisas podem ficar um pouco ridículas. Apesar de cocaína fácil de dixavar ser uma exigência dos connoisseurs, esse aparelho pode ser um certo exagero quando você pode, sabe, passar o pó numa peneirinha como todo mundo faz.

Mas admito que a criatividade deles nesse calor que está fazendo no Reino Unido é muito interessantes de acompanhar. Como o cara acima que pensou em fazer um spray nasal com cocaína em vez de ficar andando por aí com seu papelote.
A cultura chega até a ser uma ciência, com os caras aconselhando a lavar o nariz com um pote e solução salina, e endossando lotes que particularmente zoam menos as narinas. Alguns mandam sua cocaína ser testada para saber a pureza. O cara abaixo descreve o barato de um lote que ele gostou.

Mas como o resultado leva semanas pra sair, a maioria prefere cheirar logo seu papelote, porque não importa quanto esses caras se achem superiores, sua ilusão de ser um especialista em pó esconde um vício – como suspeito ser o caso desse cara – ou aquela atitude escrota básica de quase todo mundo que cheira.

O efeito colateral disso é que os traficantes da deep web lucram em cima do que é basicamente um grupo ingênuo, rotulando seus últimos lotes como continuações dos anteriores, já que a cultura é instantaneamente nostálgica e tão ansiosa para se agarrar a qualquer garantia.

Por exemplo, em maio, um vendedor abriu um lote chamado XXX v1 que foi amplamente considerado eufórico, suave e tendo pernas, aí, um mês depois, ele começou a vender outro lote chamado XXX v2 que fez algumas pessoas passarem mal, já que – como alguns acusaram – o pó na verdade era speed.
Estranhamente, muitos escolheram não condenar o traficante, mas se envolver numa teoria da conspiração que parecia oferecer tanto entretenimento quanto a droga em si. Duas semanas depois saiu o lote XXXv3 que, segundo o traficante, vendeu superbem.
Matéria originalmente publicada na VICE US.
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