A Mossless in America é uma coluna que apresenta entrevistas com fotógrafos documentais. A série é produzida em parceria com a revista Mossless, uma publicação fotográfica experimental comandada por Romke Hoogwaerts e Grace Leigh. Romke começou a Mossless em 2009 como um blog em que ele entrevistava um fotógrafo diferente a cada dois dias. Desde 2012, a Mossless já teve duas edições impressas, cada uma lidando com um tipo diferente de fotografia. A Mossless foi destaque na exposição Millemmium Magazine, de 2012, no Museu de Arte Moderna de Nova York, e conta com o apoio da Printed Matter, Inc. A terceira edição, um volume dedicado à foto documental norte-americana dos últimos dez anos, é intitulada The United States (2003 – 2013) e foi lançada recentemente.
Yeon J. Yue mora em Nova York, mas nasceu em Seul, Coreia do Sul, em 1979. Depois de servir ao lado de tropas da Força Aérea norte-americana na Base Aérea de Osan, em Pyeongtaek, quando estava na Força Aérea coreana, Yue se interessou em documentar a vida das famílias de militares norte-americanos. Ele veio para os EUA para estudar no Art Centre College of Design em Pasadena, Califórnia, e fez mestrado em fotografia na Universidade Columbia. Conversamos com ele sobre álbuns de família como forma de arte, como é morar numa base militar e a vida doméstica triste, irônica e bela dos soldados.
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VICE: Quando você se mudou para os Estados Unidos?
Yeon J. Yue: Cheguei em Los Angeles um dia depois do Natal em 2006. Já faz quase oito anos.
E que lugar você chama de lar?
Nem a Coreia nem os EUA. Acho que estamos jogados pelo mundo. Sempre achamos que estamos tomando decisões, mas só fazemos o que podemos, vivemos aonde a vida nos leva. É tudo inesperado. Especialmente depois que casei e tive um filho, o lugar que chamo de casa não importa mais para mim.
Você se alistou na Força Aérea coreana aos 22 anos para cumprir seu dever nacional e serviu com a Força Aérea norte-americana por dois anos e meio. Como foi essa época de sua vida?
Servi de março de 2001 a setembro de 2003. Logo depois que me alistei, aconteceu o 11 de setembro. Na verdade, o ambiente em que trabalhei na base americana não era de todo novo para mim, eu já tinha morado lá alguns anos quando meu pai estava servindo. Mas o 11 de setembro e todos os seus desdobramentos políticos, financeiros e sociais foram surpreendentes para um coreano de 20 e poucos anos, e, com certeza, também para aqueles jovens americanos que viviam no exterior.
Mas eu era um encrenqueiro. Eu não gostava de todos aqueles regulamentos estritos, ou da diferença injusta entre as condições de trabalho para americanos e coreanos. Lembro que estava sempre nervoso. E nem sabia por que estava nervoso. Lutei muito, discuti com muitas pessoas, tanto coreanos como norte-americanos. Mas, por mais estranho que pareça, algumas pessoas gostavam de quem eu era, do que eu fazia, e apoiavam o modo como eu pensava. Foi um tempo muito interessante da minha vida.
Depois desse período, você começou a documentar a vida das famílias de militares norte-americanos. O que te compeliu a começar essa série?
Comecei a me interessar por fotografia vernacular e fotos de família quando vivi em Glendale, Califórnia, e frequentei o Art Center College of Design. O álbum de família é uma forma muito básica de fotografia, e eu estava interessado em suas qualidades e características únicas. Isso não tem um estilo. Não tem mensagem ou direção. Isso apenas existe. Eu gostava disso. Eu gostava da simplicidade disso. Então comecei a fotografar meus vizinhos. E depois de alguns anos na Costa Oeste, decidi me aprofundar mais no trabalho num programa de mestrado em artes, e, felizmente, fui aceito na Universidade Columbia. Sempre quis fazer isso do outro lado do país. E comecei a série como um projeto expandido das fotografias de álbuns de família.
Quando penso no que os EUA significam para mim, isso sempre me faz lembrar da minha infância, quando eu me mudei para a Base Aérea de Osan com meus pais: cães K-9 ameaçadores ficavam no portão principal. Lembro de visitar a casa de um oficial que tinha uma escada bem legal e um grande lustre falso em cima da minha cabeça. Lembro o show de mágica dele, em que ele tirou a calcinha da minha mãe por cima da calça dela, o que achei o máximo. O símbolo do McDonald’s, o símbolo do Kentucky Fried Chicken e todos aqueles soldados bêbados à noite. E, por último, o cheiro de sabão em pó Tide nas roupas lavadas.
Uma de suas fotos de que mais gosto é a Gun in a Vase. A foto mostra um arranjo de cabeceira com uma arma meio que escondida entre as flores. É uma imagem alarmante. Qual é a história por trás dela?
É o quarto dos meus amigos Tony e Lisa. Conheci o Tony em Osan, ele trabalhou muitas vezes comigo no portão principal. Somos amigos desde então. Ele tinha 19. Eu tinha 22. Éramos jovens. Como ele foi mandado para o Afeganistão, não nos falamos por cinco anos. Não me lembro como entramos em contato de novo, mas lembro da primeira vez em que nos falamos depois desses cinco anos. Ele estava em lua de mel em San Diego.
Ele me convidou para visitar Shevlin, Minnesota, a cidade onde ele vive, quando eu estava numa viagem cruzando o país. Eu queria muito me encontrar com ele, então decidi dormir no carro por uma semana para economizar dinheiro para comprar uma passagem de avião. Felizmente, isso aconteceu no verão. Quando cheguei lá, foi uma experiência surreal para mim. Tínhamos envelhecido, estávamos com 30 e poucos anos, e nossos dias de viver sem medo tinham acabado.
Na manhã seguinte, depois que a Lisa foi trabalhar, vi o criado mudo no quarto deles. Vi que tinha uma arma no vaso perto da foto da lua de mel deles. Pensei: isso é a América. Era triste, mas, ironicamente, era bonito também.
E quais são seus planos agora?
Estou fotografando e filmando em escolas de atores em Nova York. Também estou fotografando com todos os tipos de câmeras digitais para outro tipo de retrato de família, que será formado de fotografias de famílias que vivem perto de onde moro.
Yeon J. Yue obteve seu título de mestre em Artes Visuais pela Universidade de Columbia em 2011. Seu trabalho já teve exposições individuais em Nova York e Birmingham, Alabama, e ele participou de várias exposições coletivas em Los Angeles, São Paulo e Seul.
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Tradução: Marina Schnoor
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