Em 1980, eu era uma modelo de 20 anos trabalhando em Paris. Nunca fui uma supermodel, mas passei um ano lá, lentamente subindo a escada da fama parisiense. Era trabalho duro, mas eventualmente comecei a aparecer em capas de revistas, o que era um tipo de prêmio, acho, mas não me sentia diferente de antes. Eu não me sentia realizada ou satisfeita. O que eu precisava, eu achava, era um relacionamento.
Um dia no fim do verão, minha agente perguntou se eu queria ir com ela para Monte Carlo no final de semana. Sabendo que sempre tem uma pegadinha no negócio de modelos, perguntei quanto custava a passagem e o hotel. “Não”, ela disse. “Essa viagem é grátis!” Eu sabia que parecia suspeito, mas decidi ir mesmo assim porque precisava de umas férias.
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Depois de chegar no hotel, passei um dia na beira da piscina tomando drinques chiques, conversando com novos amigos e apreciando a vista maravilhosa. Naquela noite, minha agente me levou de limousine para uma festa temática de piratas com vista para o Mar Mediterrâneo. Era um grande evento a céu aberto, com uma fogueira e música cigana ao vivo.
Não demorei muito para notar um homem mais velho me observando. Pode parecer bizarro, mas o homem parecia ser alguém seguro por alguma razão. Ele se aproximou e começamos a dançar na areia. Jogamos nossas taças de champanhe na fogueira, além de algumas cadeiras de madeira. Então sentamos lado a lado numa mesa grande da festa, ele olhou nos meus olhos, puxou a manga da minha blusa, expondo meu antebraço, e escreveu “eu te amo” com o próprio sangue. Aparentemente, ele tinha se cortado quebrando as taças. Eu não sabia quem ele era, mas gostei muito dele.
Mais tarde, descobri que o homem se chamava Adnan Khashoggi. Ele era um comerciante de armas saudita e um dos homens mais ricos do mundo. Ele tinha negócios, propriedades e mansões por todo o globo, e era conhecido por seus brinquedos de luxo – o maior avião particular do mundo e um iate chamado Nabila.
Bom, você tem que lembrar aqui que eram os anos 80 e a internet ainda não existia. Não dava pra jogar o nome dele no Google, então entrei nessa às cegas e fui montando o quebra-cabeça pelo caminho. E no processo descobri que namorar um bilionário não é tão incrível quanto você imagina. Mas tive que aprender algumas lições para perceber isso:
Dinheiro te torna estranho
Me encontrei com Adnan no dia seguinte, e depois de algumas semanas, ele me levou de avião para a Espanha e perguntou se eu queria ser uma das esposas dele. Dei um sim muito hesitante, e assim me tornei uma peça de xadrez no tabuleiro interno dele.
No começo, a riqueza e os excessos pareciam novos, estranhos e intrigantes. Mas com o tempo, comecei a esperar isso. Uma vez no Quênia, Adnan tentou me dar um anel com um diamante enorme de 20 quilates. Recusei o presente porque fiquei chocada e sobrecarregada. Mas com o tempo, vi outras mulheres usando essas joias caras e comecei a querer também. Vestidos de alta-costura se tornaram meus trajes normais de jantar. Eu comia pratos deliciosos e saudáveis preparados por um chef. Eu andava em limousines e jatinhos particulares.
Lentamente, comecei a desejar esse estilo de vida mesmo quando não estava com Adnan. Quando estava trabalhando em Los Angeles como modelo, eu procurava qualquer desculpa para comer em restaurantes caros. Nenhuma das minha amigas conseguia bancar isso, então eu ia com um amigo médico. Eu precisava usar vestidos de grife, ser chique, comer à luz de velas em restaurantes com toalhas de mesa de linho branco, servida por garçons em uniformes brancos. Fui sugada para esse mundo, mas não tinha consciência do que tinha acontecido comigo. Quando eu passava tempo com as minhas amigas próximas, às vezes eu ficava desejando todo aquele luxo.
Riqueza extrema significa que você nunca está satisfeito
Um ano depois do começo do nosso relacionamento, comecei a sentir ansiedade extrema. Não importa o que eu fizesse, eu não conseguia impedir que minha cabeça ficasse espiralando. Eu estava me tornando como o Adnan, sempre buscando o próximo barato: o próximo grande brinquedo, a próxima mulher, o próximo negócio incompreensivelmente lucrativo, ou a próxima carreira de cocaína.
Como ele, comecei a ficar obcecada em tentar preencher os vazios na minha alma. O problema é que quando você tem opções infinitas, meio que parece que você não tem opções e isso fode com a sua cabeça. Por que fazer qualquer coisa se eu podia ter qualquer coisa? Meus antigos objetivos de trabalhar pesado para ganhar sucesso financeiro de repente não significavam mais nada.
Os ultrarricos vivem cercados de pessoas que querem alguma coisa
Eu não sentia ciúmes no começo do relacionamento. Eu sabia que era a mulher favorita dele, porque ele passava todo seu tempo livre comigo. Mas aí comecei a frequentar uma faculdade de moda muito exigente de LA, e meu trabalho nos mantinha longe por grandes períodos de tempo. Na minha ausência, Adnan começou a passar tempo com outras mulheres. Algumas pareciam desesperadas, algumas eram viciadas em cocaína, e todas estavam atrás do dinheiro dele. Eu não era como elas, eu dizia a mim mesma.
Mas uma noite, eu estava com um grupo de mulheres num show em Las Vegas, e uma delas me mostrou um anel que Adnan tinha acabado de dar a ela. Era exatamente o mesmo tipo de anel que ele me deu! Foi como um soco no estômago e comecei a ver as coisas como realmente eram. Era o começo do fim para nós.
Dinheiro não compra felicidade
Terminamos não muito depois daquela noite em Las Vegas e foi principalmente um alívio. Descobri que buscar a felicidade através de riqueza é como perseguir a própria sombra. Não há um objeto mágico ou dinheiro suficiente que faça uma pessoa se sentir completa e em paz. Paz não está em objetos, poder, status ou dinheiro. Paz duradoura só pode ser encontrada dentro de você e chegar lá é uma jornada muito pessoal. Me tornei melhor em aceitar minhas próprias falhas e erros, e sou muito mais grata, tenho mais compaixão e julgo menos hoje em dia. Encontrei realização através do amor dos meus amigos e família, e criando arte usando meus talentos e dons. No geral, passei por um grande processo de cura, e finalmente posso dizer que realmente sei como ouvir, e respeitar, minha voz interior.
Matéria originalmente publicada pela VICE Austrália.
Este é um pequeno trecho do nosso último episódio de Extremes: um podcast da VICE exclusivo no Spotify. Ouça a história completa aqui.
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