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‘Resident Evil 7’ e o prazo de validade do medo

Resident Evil 7 dá um puta cagaço de jogar. De verdade. Explorar a propriedade dos Baker e conhecer os membros da família é uma mistura de pavor, tensão e muitos sustos. Porém, algo que me decepcionou profundamente enquanto jogava é que aquela sensação de medo tem um prazo de validade.

Antes de desenrolar esse papo, dê uma olhada rapidamente em dois curtas de terror: Mamá e Lights Out. Ambos são excelentes e obrigatórios para quem gosta de ficar arrepiado de medo. Sério, vai lá assistir no YouTube, de preferência à noite e sozinho em casa.

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Já as adaptações pro cinema de ambos os curtas não são tão recomendáveis assim. Valeu a tentativa, mas nenhum dos dois filmes chega perto de passar o nível de cagaço dos curtas. Talvez isso tenha acontecido porque o clima de medo e tensão foi ideal para um vídeo de menos de três minutos na internet, mas se perdeu quando foram esticados para formar um longa-metragem. De certa forma, é o que acontece também com Resident Evil 7.

Assim como Mamá e Lights Out, Resident Evil 7 foi primeiramente apresentado como um curta-metragem, ou o equivalente a isso nos videogames, com a demo Beginning Hour, lançada no meio do ano passado. A demo, assim como os curtas, consegue provocar uma sensação de medo que vai direto ao ponto, dada a natureza breve da experiência.

Em entrevistas, o diretor Koushi Nakanishi falou que o intuito da Beginning Hour não era só fazer o jogador experimentar um trecho do jogo, mas servir como uma prévia pro tom do que encontraríamos em Resident Evil 7, mostrando os elementos que seriam o alicerce pro jogo final. “Nós focamos nos conceitos que queríamos que os jogadores entendessem sobre o jogo, principalmente no horror”. Deu super certo.

Dona Marguerite não está pra papinho em RE7. Imagem: Capcom

Chega 2017, e com Resident Evil 7 em mãos, vemos que o jogo entrega uma das melhores experiências de terror em um videogame, muito por seguir a estrutura que a demo havia estabelecido, dando destaque pra exploração de um ambiente opressor e criando um clima de tensão e alerta constante. Os encontros com Jack Baker, o esconde-esconde com Marguerite, a munição que nunca é suficiente pra matar os monstros mofados — todos esses momentos expandem a experiência inicial da Beginning Hour.

Só que não dá pra sentir medo o tempo todo por horas de jogo. Quando Resident Evil 7 parece que chegou ao seu clímax, ele cai na armadilha de se estender mais do que deveria, perdendo nas suas últimas horas muito, se não completamente, a atmosfera que constrói tão bem no início.

A tensão que funcionava nas primeiras horas vai sendo anestesiada conforme a ação vai tomando conta da experiência na segunda metade do jogo, ao ponto de, no final, Resident Evil 7 virar quase um FPS com o jogador tendo um arsenal de armas contra uma horda de monstros. A data de validade do medo venceu, mas o jogo continuou.

Essa falha não chega a ser exclusiva de Resident Evil 7 e está presente em outros games do gênero, inclusive lançamentos recentes. Outlast, por exemplo, também sofre do mesmo mal de se estender demais. Isso me fez questionar se existe um limite para a duração de jogos de terror não perderem a mão.

Outlast é um dos grandes nomes do terror recente nos games. Imagem: Red Barrels Studio

Se olharmos pro que o terror proporcionou de melhor nos últimos anos em videogames, a resposta está nas experiências mais contidas e curtas, como a própria demo Beginning Hour de Resident Evil 7, ou talvez até mesmo Slender: The Eight Pages. O despretensioso jogo independente de 2012 deixou todo mundo com medo de ir ao banheiro à noite porque o corredor estava com a luz apagada e você pulou de susto no meio do caminho quando o seu vizinho fez um barulho.

Como não falar também de P.T.? O Playable Teaser (uma demo de Silent Hills, que foi cancelado), de Hideo Kojima e Guillermo Del Toro, ainda continua vivo na memória e nos sortudos que ainda possuem ele no HD do PS4, não só por causa da série Silent Hill, mas também por conseguir causar tanto pavor com apenas dois corredores em loop.

É bom lembrar de novo: Resident Evil 7 dá medo. Outlast também. Mas em jogos mais curtos, a limitação de tempo pra experiência parece servir como um catalisador para momentos mais intensos, sem enrolação, onde o terror não precisa ser diluído nas várias horas de um jogo completo. Por isso, o prazo de validade para sentir medo nos videogames talvez esteja na qualidade e não na quantidade de tempo que você o joga. É o clássico caso do menos ser mais.

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