Bacon e Cerveja

Foto: Caiuá Franco

Alguém pode me explicar o que está pegando com o bacon? Nos últimos cinco anos, o bacon passou de “aquele segredo que minha avó coloca no feijão” para “CARALHO! EU QUERO FAZER UMA TATUAGEM DE BACON!”, o que me deixa muito confuso. Não é que eu sou daqueles chatos que não gosta de bacon. Mas confesso que sinto falta da época em que não precisava usar calça apertada para apreciar o sabor de barriga de porco defumada.

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O pessoal do espaço Hotel Galeria teve a ideia de fazer o evento Art Gourmet. A proposta era harmonizar os sabores do bacon com a cerveja e com as artes do Marcelo Cepis, que já estavam expostas por lá. Rolou degustação de pratos com temas relacionados ao bacon, além de uma cerveja aromatizada de bacon. O ponto alto do evento foi o momento em que a chef Paloma Zaragoza afogou um belo pedaço de bacon no barril de fermentação de uma cerveja caseira que eles prepararam no local. Inclusive, eles tinham uma placa escrito “We Love Bacon” que as pessoas usavam para atualizar suas fotos em redes sociais.

Foto: Caiuá Franco

A promessa de cerveja e porco sendo servidos indiscriminadamente de diversas maneiras em uma tarde de sábado ensolarada atraiu a esperada quantidade de pessoas que gosta desse tipo de coisa. No fundo da galeria estava rolando uma degustação de chopp. “É desses normais. Não tem gosto de nada. Só de cerveja”, explicava um dos garçons a uma dessas pessoas que cumpre o seu papel de frequentador de degustações em vernissages e faz perguntas sobre tudo o que coloca na boca.

Logo atrás, outra figura clássica desses eventos: a barraqueira. “Tá demorando pra sair esse chopp, hein?”, uma senhora com um vestido longo e óculos escuros berrava sem se direcionar a ninguém em específico. Era um dia quente, as pessoas demandavam chopp. É São Paulo e a fila era grande. Estranhamente, não tinha fila para as pipocas de tripa de porco na entrada da galeria. Prioridades, cidadãos paulistanos, prioridades.

Foto: Caiuá Franco

Povo reunido, as comidas começaram a ser servidas. Me aproveitando do humor simpático com que todos estavam depois de começar a comer (e principalmente beber), fiz perguntas a algumas pessoas que estavam por lá. Do casal que discordava sobre a popularidade do bacon, ao mestre cervejeiro que comandava o barril de fermentação na entrada da galeria, conversei sobre a contracultura do saudável, o niilismo do porco e como cometer um crime misturando cerveja com bacon.

Foto: Caiuá Franco

Victor Marinho é mestre cervejeiro e preparou ali mesmo a cerveja caseira com bacon – que só vamos poder tomar daqui a dois meses.

VICE: Me explica, por que o bacon?
Victor: Bacon? Tem um lance de quebrar essa ideia que vivemos em uma sociedade de comidas saudáveis e tudo o que é saudável. Acho que tem uma questão de sabor e prazer, e da vontade de viver conforme você quer, você gosta. O bacon tem isso, de quebrar um pouco as regras, mas de uma forma descontraída, uma forma mais gostosa.

Bacon é uma coisa rebelde?
É, a palavra rebelde é meio estranha. Acho que comer bacon é quebrar um pouco do preconceito, quebrar padrões. E a cerveja, com o bacon dentro, é algo inédito. [Ele mexe o líquido dentro do barril de fermentação] Então, a cerveja vai ficar bem gostosa.

Você acha que o bacon sofre um preconceito?
Sofre, sim. Vive à margem da sociedade. (risos)

Quem tem preconceito contra o bacon?
Ele sofre preconceito por ser uma comida gordurosa, que não é saudável.

Mas na cerveja não tem problema, né?
Então, pela legislação brasileira, é proibido, né?

Quer dizer que estamos fazendo um esquema proibido hoje?
Isso.

Então, rola uma vibe rebelde.
É, rola. Estamos preparando uma bebida alcóolica que, pela lei brasileira, não pode ter nenhum contato de derivados animais. Então, é só para dar um saborzinho. Um saborzinho extra.

Luis Tostes e Letícia Miglio estavam escondidos debaixo da sombra da árvore, e foram os únicos que me convenceram de que sabiam o que estavam fazendo lá.

Como vocês vieram parar aqui?
Luis: A culpa é toda minha. Eu participo daquele site, o Have a Nice Beer. O intuito deles é lançar cervejas inéditas no Brasil. Eles vendem cervejas que você não encontraria nos outros mercados por aí. Então, eles mencionaram que ia ter a cerveja de bacon nesse evento… que no Brasil é proibida de ser produzida.

Espera. De certa forma, está todo mundo aqui cometendo um crime. Vocês não estão preocupados de baixar polícia aqui?

Luis: (Risos) Tô de boa! Não sei de nada. Essa é uma história boba, né? Foi a ANVISA [Agência Nacional de Vigilância Sanitária] que criou essa regra, de que não se pode comercializar nada no Brasil que seja alcóolico e tenha bicho dentro.

Por que o bacon está tão popular? Por que você acha que está rolando essa fissura, de repente?
Luis: É coisa de gordo, né? (risos) Eu não sei explicar…

Letícia: Eu vim pela cerveja! (risos) Acabei vindo porque gosto mesmo de cerveja, vi que ia ter a de bacon e também outra de abóbora.

Vocês comeram as pipocas de tripa que tinha na entrada?
Luis: Ah, ela achou muito gorduroso, então passou reto! É bom, mas é pesado. Vou esperar pelo bacon que vem aí. Não vou ficar comendo essa pipoca [de tripa] porque aí a veia entope e já era.

Vocês comem bastante bacon, normalmente?
Luis: Uma vez por mês, com certeza, né? Por exemplo, se eu for no Burger King, e lá o bacon é a parte, sempre peço com bacon. Eu sei que não é saudável nem nada, mas tenho que aproveitar que estou vivo ainda, né?

Você acha que rola uma pressão para viver uma vida saudável? Esse evento tem uma parada de libertação, também.
Luis: É, a galera tenta promover essa história de ‘seja vegetariano’. Em São Paulo, tem um monte de viadutos pixados com essa frase, com um sorrisinho embaixo. Mas eu não ligo (risos). Depois eu penso nisso, cara. Tenho muito tempo pra viver ainda.

Foto: Caiuá Franco

Marco Fábio Levy estava lá sozinho, mas, como quase todo mundo com quem conversei, ele conhecia os organizadores do evento.

Como você veio parar nesse evento?
Marco: Eu frequento muito aqui. Achei super interessante essa ideia de harmonizar o bacon com a arte do Marcelo Cipis. Achei diferente.

Me explica essa moda do bacon?
Na verdade, eu não sei, porque eu não sou muito fã de bacon e normalmente não como. Mas eu vim mesmo assim. Já experimentei uma coisa ou outra hoje. Esse lance de harmonizar é muito bacana, nunca tinha imaginado que fosse assim. Trabalho bastante com arte, eu sou fotógrafo, e gostei da ideia de juntar comida com as artes. Isso junta o pessoal.

Você não fica preocupa que o bacon possa fazer mal?
Estou dando uma maneirada, na verdade. Mas aproveito as outras coisas, tipo a cerveja. E é interessante, porque eu também não bebo cerveja. Mas estou aqui, né? É uma experiência diferente.

Eu descobri que existe uma lei que proíbe misturar o bacon na cerveja aqui no Brasil. Você pensou que está fazendo algo proibido?
Acho que é uma coisa bem pontual, não apareceria ninguém aqui pra prender a gente. A ANVISA gosta de proibir diversas coisas que no mundo inteiro é aceito. Eu não entendo.

Tipo a maconha?
Mas maconha não é só no Brasil. É só em Amsterdã que é liberado, né?

Você já imaginou um mundo em que o bacon fosse proibido?
Eu não me incomodaria, mas muita gente, sim.

Foto: Caiuá Franco

O Luis Cunha parecia estar bem feliz cercado de petiscos de porco e cervejas caras. Quem não estava?

O que você está fazendo aqui hoje, Luis?
Luis: Vim parabenizar o pessoal da galeria e comer esses bacons todos. (risos)

Me explica, por que o bacon está bombando tanto ultimamente?
Desde muito cedo a gente come bacon, e é uma coisa forte, visceral. Acho interessantíssima essa harmonização que [a galeria] fez com as cervejas e o bacon. Isso é novo, é uma coisa que, em São Paulo, não vi ainda. E acho que fazer esse encontro da arte com os dois aguça os sentidos. É muito interessante. É uma fórmula nova e bem gostosa de participar. É um bônus em uma exposição de arte.

Agora, eu sou a favor do bacon desde criança, lembro que todo mundo pedia x-salada quando na cantina da escola enquanto eu sempre pedia x-bacon. Eu gostava de fritas com bacon também. Eu adorei essa ideia. E bacon foi uma surpresa, porque eu não esperava que fosse rolar uma harmonização em uma exposição de arte com um sabor tão forte. Bacon é bacon, né? Uma pessoa com bacon fica melhor. Até uma mulher, se você a enrolar no bacon e comer, ela fica mais gostosa.

Você não fica um pouco preocupado que o bacon não seja muito saudável?
Mas o que é saudável hoje em dia? A gente está em uma cidade completamente doente, e sou a favor de saciar as vontades. Se você quiser comer bacon até morrer, então coma bacon, sabe? É melhor do que fazer coisas terríveis que hoje em dia acontecem: a preocupação com a vida alheia, a banalização da sua imagem em redes sociais, e todas essas coisas.

O bacon é quase um movimento niilista hoje em dia?
É. Ainda mais que esse lance de hoje com o bacon é proibido. Não pode colocar bacon na cerveja no Brasil. Em um país que se diz tão liberal, um país do carnaval, se mostra, ao mesmo tempo, muito careta. O lance é, libera o bacon, gente. Matem a fome. (risos)

Foto: Caiuá Franco

Rafael Marreiros tem um blog de comida e estava tentando sacar esse lance de harmonização comigo.

Por que o bacon está tão popular?
O bacon é perigoso. É mais atraente. Agora é assim, gordura é vida, açúcar é vida. Pra quem gosta de comida, pra quem gosta de sabor, bacon e açúcar são tudo. É super tendência agora, até o Burger King tem sundae de bacon, que era uma coisa que a galera fazia escondido porque parecia muito nojento, mas agora não é mais.

Você acha que a galera está saindo do armário do bacon?
Boa definição. A galera tá saindo do armário. Há pouco tempo, a moda era a comida muito saudável. Antigamente, a nouvelle cousine tacava um foda-se. Usava manteiga. Depois disso, veio uma moda muito saudável, vegetariana, drama de gordura trans. E agora, eu acho que as pessoas estão pensando, “Tá bom, a gente tem que ser saudável, mas não vamos esquecer do bacon e do açúcar.”

E isso está mudando as coisas?
Com essa onda de saudável, até os salgadinhos mudaram o sabor – depois que eles decidiram cortar as gorduras trans, por exemplo. Eu fiquei meio triste. A bolacha era melhor antigamente.

Foto: Caiuá Franco

Bruno e Paula não quiseram tirar foto e nem dar o nome completo. Talvez eles estivessem fugindo do chefe judeu ortodoxo que não gosta de porco nem de sábados ao ar livre? É uma teoria.

Vocês sabem por que o bacon está tão popular ultimamente?
Paula: Tá mesmo. Concordo. Eu não sou muito fã de bacon, mas agora tem bacon em tudo o que é lugar. Vou ter que aprender a gostar. (risos)

Bruno: O bacon é o cúmulo da gula. É o seu desejo de comida pesada, gorda. O bacon, o hambúrguer, essa coisa americanizada de ‘o que te deixa mais gordo’. É o ápice da gordura, da satisfação.

É como se o bacon fizesse parte de uma contracultura do saudável.
Paula: Eu sinto que o bacon mudou na forma em que está sendo vendido e como está sendo vendido. É como se ele tivesse saído da sarjeta. O bacon é um negócio gorduroso, mas aqui é como se não fizesse mal algum.

Vocês comem bacon em casa?
Paula: Eu não como de jeito nenhum!

Bruno: Na minha casa eu não como. Não costumo preparar em casa, só quando saio. O porco, pra mim, é a melhor carne que tem. É a carne que mais se assemelha a nossa, então ela é absorvida melhor que as outras. Acho que o porco em si está sendo vendido de uma forma mais amigável que antes.

Paula: Era isso que eu estava falando. O porco saiu da periferia. O bacon principalmente. Hoje em dia, até a orelha do porco, frita, bem apresentada, vai que é uma maravilha. Do mesmo jeito que eu não acredito em duende, também não acredito que o bacon ficou gostoso do dia pra noite. Óbvio que não.

Foto: Caiuá Franco

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