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Medo, tortura e dependência. O cinema que andamos a ver

Doze filmes, divididos por três temáticas. A maior parte estreia nas próximas semanas em Portugal.
(Da esq. para a dir.) Joaquin Phoenix ("You Were Never Really Here"), Emily Blunt ("A Quiet Place") e Nick Robinson ("Love, Simon"). Três actores em destaque num cinema perto de ti. (Fotos: Cortesia Amazon Studios, Paramount Pictures e Twentieth Century Fox, respectivamente).

Não há como dar a volta. Estamos a menos de dois meses do Verão, os grandes festivais de música estão quase a arrancar (via NOS Primavera Sound e Rock in Rio Lisboa), o Mundial de Futebol já fervilha e, claramente, é tempo de esgotar os últimos cartuchos numa sala de cinema.

Indicamos oito opções que vão ter a sua premiere brevemente no nosso país e adicionamos quatro que já estrearam antes do final do primeiro trimestre - Kedi, L'Amant du Jour, Una Mujer Fantastica e o netflixiano Annihilation. As doze obras estão divididas em três tópicos e, em cada um, aparecem em ordem alfabética.

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MEDO: do novo Predador; do desconhecido; da emancipação dos negros; do que os outros pensam; e de perder o novo amor

A Quiet Place (Um Lugar Silencioso)

FILHA: “Mãe, emprestas-me o iPad para jogar?”. PROGENITORA: “Já empresto, querida. First, deixa ouvir um pouco do disco 'I Need To Start a Garden', de Haley Heynderickx”. (Foto cortesia Paramount Pictures)

O fim do Mundo em cuecas vai mesmo acontecer (bem, aqui as roupas íntimas são usadas ao contrário de qualquer sapatinho ou chinelo supimpa). Para evitar serem caçados por um monstro que despedaça quem faça barulho - até deixar cair um utensílio de cozinha é motivo para ficar em alerta -, os cinco membros da família têm de viver em permanente silêncio.

Entre sinais e códigos para enganar um ser que, em termos de fisionomia, nos remete ao clássico Predador, a utilização da linguagem gestual é fundamental - se bem que a filha é surda (a actriz Millicent Simonds também o é na vida real). Com suspense e entretenimento suficientes para ser considerado uma das surpresas do ano, prepara-te para o cagaço, muito cagaço…

Realizador: John Krasinski (que faz parte do elenco a par da esposa, Emily Blunt). Estreia a 3 de Maio. Avaliação (1/10): 7.5 Aconselhado aos adeptos de Terror e da série Stranger Things.

Annihilation (Aniquilação)

PANAMA (PAPERS) TEAM. À procura de quem recebeu os dois milhões de euros supostamente transferidos pelo Grupo Espírito de Santo, no caso dos Submarinos. (Foto cortesia Netflix)

Arrebatador. Fantástico. Excepcional. Estas três palavras definem o que muitos sentiram ao ver Ex-Machina (2014), trabalho que marcou a estreia de Alex Garland. As expectativas em redor do regresso do cineasta britânico eram muitas mas, no fim, este Annihilation sabe a desilusão. Baseado no livro com o mesmo título, a estória gira em redor de uma bióloga (Natalie Portman) que vê o seu marido desaparecer numa missão militar. Posteriormente, o mesmo volta a casa e é internado por razões misteriosas.

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A fim de descobrir o que lhe aconteceu, ela parte numa expedição com outras cientistas a um local selado pelo governo norte-americano (numa metáfora rebuscada de ghostbusters no feminino - ver foto acima). Nessa viagem, não faltam mutações para todos os gostos e desgostos, efeitos especiais de fazer inveja à última vez que tomaste ácido (se alguma vez o fizeste) e clones para deixar o telespectador confuso. Mas, em sentido oposto à “Máquina” anterior, sentimos a falta do toque de midas. Que venha rápido o seu terceiro futurismo.

Realizador: Alex Garland. Disponível na Netflix portuguesa desde 12 de Março. Avaliação (1/10): 5.7 Aconselhado à malta da ficção científica e a quem experimentou LSD.

LBJ

FIGURA À ESQUERDA: “Não podes falhar, entendeste? Convoca imediatamente o Manuel Pinho para dar explicações ao Parlamento”. O OUTRO: “Disseram-me que é difícil. Anda entretido com o presumível apartamento em Nova Iorque”. (Foto cortesia Electric Entertainment)

2 de Julho de 1964. A promulgação da Lei dos Direitos Civis, durante a presidência de Lyndon Johnson, é um marco na história dos EUA. Para que tal fosse uma realidade, houve muitos contratempos que tiveram de ser ultrapassados. Depois do actor Bryan Cranston ter feito um retrato interessante de Johnson em All The Way - com mais pormenores da vida pessoal e a inclusão de conversas com Martin Luther King Jr. -, é a vez de Woody Harrelson (Natural Born Killers) ser competente no papel do 36º “dono” da Casa Branca.

O argumento centra-se na função enquanto vice de John Kennedy, nas horas posteriores ao assassinato deste, nas diversas confrontações que teve com o irmão do líder (quem faz de Bobby tem notórias semelhanças físicas com o centrista Adolfo Mesquita Nunes - à direita na foto acima), e a pressão que foi sofrendo pelos conservadores/racistas do sul. Com mais ou menos receio, LJ foi levando a sua avante.

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Realizador: Rob Reiner. Estreia a 24 de Maio. Avaliação (1/10): 6.5 Aconselhado aos que nutrem um certo fascínio pelo clã Kennedy e a quem gosta de factos biográficos.

Love Simon (Com Amor, Simon)

ELE: “É um futebolista que merece todas as palmas na hora de deixar o Barcelona”. ELAS: “É I, é N, é INIESTA!” (Foto cortesia da Twentieth Century Fox)

Com o discernimento próprio das comédias românticas que pretendem ser um valor acrescentado à temática da homossexualidade, o espectador entra na vida de um rapaz que enfrenta o fantasma do seu verdadeiro sentimento. Seguindo à risca o mote “nem às paredes confesso”, refugia-se numa troca de mensagens electrónicas com outro indivíduo com medo de “sair do armário”.

Enquanto a sua dúvida vai persistindo (quem é o colega lá da escola?), acompanhamos os assuntos do coração dos amigos mais próximos. Há a melhor amiga que está embeiçada por ele desde sempre (a protagonista da série 13 Reasons Why); a nova bff que tem de aturar um colas-chantagista com laivos de galanteador; e o jovem futebolista, fã de Ronaldo, que é “desviado” a conquistar quem pouco lhe diz.

Realizador: Greg Berlanti. Estreia a 21 de Junho. Avaliação (1/10): 7 Aconselhado a quem já passou pelo mesmo e quem se emocionou com o nomeado ao Óscar, Lady Bird.

Submergence (Submersos)

ELA: “Como é que pretendes celebrar os 50 anos do Maio 68?”. ELE: “Vendo 'The Dreamers', de Bertolucci, pondo a tocar 'É Proibido Proibir', de Caetano, folheando o livro 'When Poetry Ruled The Streets', de Andrew Feenberg, e encontrando alguém para dar azo à imaginação no meio dos lençóis!”. (Foto: Cortesia TIFF/Mars Distribution)

O que fazem dois solteiros, com boa aparência, num hotel de excelência? Guarda a resposta para ti, pois, neste caso, falamos de dois personagens em retiro antes de partirem para as maiores aventuras das suas carreiras. Ela é matemática e bióloga (a actriz Alicia Vikander), ele diz-se engenheiro em África mas, na verdade, trabalha para os serviços secretos britânicos (James McAvoy).

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Coincidentemente, desembarcam no mesmo alojamento onde se apaixonam e vão trocando pensamentos sobre diversas matérias - podes esperar um pouco de seca… Ultrapassada essa intimidade que leva a uma árdua despedida - é assim quando se percepciona que pode ser o amor da nossa vida -, chega o perigoso destino no plano profissional. Ela a explorar as profundezas do mar, ele a apanhar um dos terroristas mais procurados do Planeta. Nisto, a qualidade desta obra vale o bilhete? Se não houver melhor programinha…

Realizador: Wim Wenders. Estreia a 24 de Maio. Avaliação (1/10): 5.5 Aconselhado aos cinéfilos que não perdem uma do multifacetado artista germânico e aos que iniciaram um relacionamento amoroso há pouco tempo.

TORTURA: por parte de mentes pequenas e preconceituosas; e causada por traumas no passado

Una Mujer Fantastica (Uma Mulher Fantástica)

ELE: “Há quase quarenta anos apaixonei-me com uma canção dos Abba. Espero que as novas não decepcionem”. ELA: “Desde pequenina, a minha favorita é 'Knowing Me Knowing You'”. (Foto cortesia Sony Picture Classics)

Tal como tinha acontecido com Moonlight, em 2017, dá a sensação que Una Mujer Fantastica triunfou nos últimos Óscares - categoria de Melhor Filme Estrangeiro - por causa da temática abordada. No segundo, Marina (Daniela Vega) é um transexual que tem um romance com um homem muito mais velho. Após a morte súbita deste, ela enfrenta diferentes situações de desconforto por causa da sociedade que a rodeia (por exemplo, é lamentável o que se passa no consultório do médico, enquanto o seu corpo é inspeccionado).

Os preconceituosos familiares do namorado querem que ela desapareça dos seus horizontes, recorrendo à violência psicológica e/ou física. No entanto, Marina (que serve à mesa e tem o sonho de ser intérprete de canto) mostra uma personalidade forte e vai resistindo a todos os obstáculos - até do vento… As hostilidades de que é alvo não a quebram, sendo a luta pela custódia da cadela uma imagem fiel da sua tenacidade. Este filme chileno merece ser visto, mas fica abaixo do concorrente sueco The Square.

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Realizador: Sebastián Lelio. Estreou, no nosso país, a 21 de Dezembro de 2017. Avaliação (1/10): 6.5 Aconselhado a todos que não percebam o quão difícil pode ser o dia-a-dia de um transexual e o drama da não-aceitação por parte de outros.

You Were Never Really Here (Nunca Estiveste Aqui)

ADOLESCENTE: “O que é a Lei da Paridade?”. ADULTO: "Num mundo tão machista como o nosso, há coisas que têm que ser impostas. A igualdade de oportunidade e tratamento, entre géneros, devia ser normal e não obrigatório”. (Foto cortesia Amazon Studios)

Walk The Line (2005) e Her (2013) são duas marcas impressionantes no percurso de Joaquin Phoenix. Mais do que discutir se é tempo de receber um Óscar, o actor não desarma nos papéis que representa. Desta vez, é um ex-soldado e antigo agente da FBI, que se auto-flagela por traumas de infância, vive com a mãe adoentada e é contratado para salvar miúdas obrigadas a prostituirem-se. Com um ar pouco amistoso e a aquisição de um martelo, o personagem de Phoenix enfrenta uma missão que vai mudar o seu trajecto. Conspiracões…

Mesmo com uma lúcida banda sonora original a cargo do Johnny “Radiohead” Greenwood (autor do que se ouviu em Phantom Thread), há, contudo, outras canções a que não se fica indiferente. Uma delas, enquanto toca na rádio, acontece durante uma cena caricata que podia constar perfeitamente num produto de Tarantino. Após um tiroteio, dois motherfuckers ficam estendidos no chão a cantar/sussurar o tema I've Never Been To Me (de Charlene). Um por estar prestes a falecer; o outro por cansaço. Que lindo dueto.

Realizadora: Lynne Ramsay. Estreia a 17 de Maio. Avaliação (1/10): 7.5 Aconselhado a todos a quem já passou pela cabeça fazer justiça com as próprias mãos e quem aprovou A History of Violence (2005), com Viggo Mortensen e Ed Harris.

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DEPENDÊNCIA: do marido com pouco sex appeal; do estranho do cemitério; da “claridade” que o outro dá; do carinho dos antigos reis da internet; e de “apetites” incontroláveis

All I See Is You (Só Te Vejo A Ti)

ELE: “Desculpa pelos nossos políticos não terem arcaboiço para dizer não à banca…”. ELA: “É bárbaro não ser possível ceder 1% do OE para a Cultura”. (Foto cortesia TIFF/Open Road Films)

Não negues à partida um filme que desconheces… Mesmo quando as críticas são terríveis. E foi o que fizemos. Partindo da premissa de que All I See Is You era pouco recomendável, o entusiasmo foi aparecendo a espaços atingindo uma razoabilidade aceitável (se bem que as várias situações da protagonista a praticar uma certa faixa musical são supérfluas).

Um casal norte-americano, que vive em Banguecoque, tem dois objectivos em mente. Ter um filho e obter uma operação para que ela possa ver novamente - a esposa ficou cega em criança, depois de um acidente de viação com os parentes. Após uma cirurgia bem-sucedida e a visão de Gina (Blake Lively) melhorar gradualmente, os dois partem para Espanha com o intuito de visitar a irmã dela. Com a química entre ambos a decrescer, questionamos: Quando viu como é o seu marido fisicamente, ela perdeu interesse (sendo que a sua libido anda on fire)? Ou é ele que fica chateado por sentir que o apoio diário que lhe dá é dispensável? No regresso à Tailândia, a tensão aumenta, a visão da esposa começa a regredir e o desenlace é superior ao expectável.

Realizador: Marc Forster. Estreia a 3 de Maio. Avaliação (1/10): 6.5 Aconselhado a pessoas que estejam com dúvidas se devem permanecer no actual relacionamento.

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Frantz

Quando se juntam alemães e franceses na tela da sétima arte, há uma remota chance de haver “molho”. Não aqui. Desde um misto de sentimentos ambíguos, a um subliminar charme gay ou aquela ideia de romance que nos leva até à última paragem de comboio, as duas nacionalidades parecem entender-se.

Alemanha, pós primeira Guerra Mundial. A linda e delicada Anna (Paula Beer) fica intrigada por ver um homem esbelto a pôr flores na campa do seu noivo - Frantz. Mais tarde, ao conhecer Adrien (Pierre Niney), este informa-a que era amigo do namorado dela antes do Conflito.

As raparigas marotas de Paris nos anos 30

Pelas imagens sugeridas, fica a ideia (pelo menos para o espectador) que havia mais para além disso… Os parentes do falecido, com quem Anna vive, ficam desconfiados por ele ser francês - principalmente o pai -, mas logo se convencem da amizade que tivera com o filho. Quando Adrien ganha coragem e conta outra versão dos factos à jovem alemã, há uma viragem no enredo e ganhamos maior curiosidade relativamente à estranha criatura. Ela também.

Realizador: François Ozon. Estreia a 10 de Maio. Avaliação (1/10): 6.8 Aconselhado às pessoas que estão no início de um namoro e para todos que concordem que há mentiras que têm a sua razão de ser.

Hikari (Esplendor/Radiance)

Esperemos que o recente encontro entre os dois chefes de Estado das Coreias, traga a luz necessária para um sorridente apaziguamento na Ásia. (Foto cortesia MK2 Films)

No final do visionamento de Hikari, há um tema de Bonnie 'Prince' Billy que nos assalta a mente: I See a Darkness. É o início dessa escuridão (um dos principais personagens está a perder a visão) e uma esperança/alegria ao fundo do túnel, que dá o sal necessário a este trabalho japonês.

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Masaya Nakamori (papel nas mãos de Masatoshi Nagase) é um fotógrafo que está prestes a ficar cego. Para que a transição seja moderada e menos impactante, assiste e dá palpites na criação de legendas numa película para invisuais. Aí, mesmo sendo um dos que não se coíbe em alvitrar negativamente, conhece Misako Ozaki (Ayame Misaki). Esta tradutora, sensível às críticas e com um passado familiar mal resolvido, não parece talhada para se dar com o carrancudo Nakamori. Mas, no dia em que ela o visita, a “luminosidade” nasce dentro de ambos.

Realizadora: Naomi Kawase. Estreia a 7 de Junho. Avaliação (1/10): 6.2 Aconselhado a quem já valorizou a insígnia “os opostos atraem-se”.

Kedi

Até estes quatro ficaram perplexos com o flirt de Trump a Macron durante este mês de Abril. (Foto cortesia Oscilloscope Laboratories)

Um documentário sobre gatos só podia ser ternurento, perspicaz e (passe a redundância) felino. Em Kedi (gato em turco) é deles que se fala e dos seus interlocutores diários. As pessoas que lhe dão mimos, abrigo ou comida - em alguns casos isso tudo junto.

Istambul é o epicentro desta experiência pelas ruas e recantos por onde andam milhares destes seres, que dialogam entre si e são acarinhados por inúmeros anónimos. A estória foca a atenção em sete gatos (número que nos remete para as sete vidas), com identidade e a habitual personalidade. São eles, Aslan Parçasi, Bengü, Deniz, Duman, Gamsiz, Psikopat e Sari. Quando puderes, faz um break e emociona-te com os belos “miaus” na terra de Erdoğan.

Realizadora: Ceyda Torun. Estreou a 25 de Janeiro. Avaliação (1/10): 7 Aconselhado a quem conviva com cats diariamente, veja o canal National Geographic e/ou tenha venerado A Marcha dos Pinguins (2005).

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L' Amant d'un Jour (O Amante de Um Dia)

RAPARIGA À ESQUERDA: “A RTP parece voltar ao tempo da tv a preto e branco…”. A OUTRA: “Porquê?”. RE: “Aparentemente têm existido pressões políticas para que a série 'Teorias da Conspiração', inspirada nos casos Sócrates e BES, seja sucessivamente adiada”. (Foto cortesia SBS Distribution/Arte France)

Os desejos sexuais e os segredos são o cimento de um argumento interessante qb, por parte do autor de L'Ombre des femmes.

O enredo inclui um professor cinquentão com um liberalismo sentimental demasiado largo (o actor Éric Caravaca); a sua descendente que regressa a casa, deprimida pelo fim de um relacionamento e obcecada pelo reatamento (Esther Garrel); e a namorada com a mesma idade da filha - 23 anitos - aparentemente segura de si própria e que, mais adiante, deixa um rasto de ciúmes e um impulso carnal com predilecção para uma determinada casa-de-banho… (Louise Chevillotte).

Realizador: Philippe Garrel. Estreou a 4 de Janeiro. Avaliação (1/10): 6.5 Aconselhado a praticantes do poliamor e para todos que curtiram Closer (2004), com Julia Roberts, Natalie Portman e Jude Law.


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