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PICOS: Escadões

Hoje inauguramos uma nova seção aqui na VICE. Vamos tratar de lugares que não são apenas localizações por onde você pura e simplesmente fica ou passa.

Hoje inauguramos uma nova seção aqui na VICE. Vamos tratar de lugares que não são apenas localizações por onde você pura e simplesmente fica ou passa. Nesses picos também acontecem ritos de passagem, e é isso que vamos mostrar. Então é isso: nós orgulhosamente tiramos o lacre desse novo pedacinho do nosso conteúdo com os portentosos escadões.

Um escadão nem sempre é uma reta, mas sempre sobe e desce. Em geral essas obras estão decoradas com camisinhas usadas e fedendo a mijo, mas também não podemos generalizar, então conversamos com algumas pessoas para saber mais um pouco sobre suas experiências ascendentes ou descendentes em escadões. Aí vão elas:

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Ditos populares ou intempéries topográficas

Guarizo, 22 anos:

"Quando eu tinha uns treze anos, estava passando por um escadão, já era quase noite, de repente vejo um cara abaixado, bem bêbado. E chegando perto, vi que ele estava cagando e estava quase caindo em cima da bosta. Cambaleando e andando, fiquei meio em choque, não estava acostumado a ver essas coisas, um cara cagando e andando. A outra história é numa vila de amigos meus, aos catorze. Não conhecia a vila, estava todo mundo de bike, 'ah, vamos lá', 'beleza, vamos descer', só que não vi que era um escadão, era bem íngreme, fui descer, achei que era uma ladeira e era um escadão. Fui rolando. Caí uns dois lances de escada de uns quinze degraus, me ralei inteiro.Frequentava escadões porque Osasco é um morro, tinha que pegar muito escadão. Escadão geralmente é tranquilo, dá de fundo para as casas e a galera fica fumando um beck, transando, tem gente que caga, acontece muita coisa.'

Nightwish, Dream Theater ou convívio social

Andres, 21 anos:

"No escadão, a galera do Sion e do Rio Branco saía depois do colégio, na sexta-feira, e ia direto, automaticamente. Primeiro eles roubavam uma Absolut ou uma Montilla, sendo que são milionários, no mercado da região. Aí eles vinham e se encontravam com uns caras da Barra Funda, que têm menos grana, e era contraste, mas todo mundo interagia pra caramba. Era muito louco, tudo misturado, filho de cara milionário e gente que a mãe ganhava salário mínimo, tá ligado? E rolava esse lance de amizade, que só acontecia por causa da maconha, esse lance social. A história do Ibirapuera aconteceu quando tinha quinze anos. Eu e meu amigo começamos a fumar maconha e a gente ficava num escadão com umas amigas. Bateu uma bad nele, uma bad forte e começou a falar uma pá de coisas, viajar, falar que era um bosta. E a gente conhecia ele, ele era fodão, então quando falou isso, a gente achou estranho. E aí ele começou a surtar e eram duas meninas que ficavam com ele, aí eu querendo fazer a fita com as minas, e ele pegou e cortou os pulsos, a gente teve de levar ele pra casa correndo, foi pro hospital, se fudeu, ficou muito louco no escadão do Ibirapuera."

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Trampas, política ou culpa católica

Daniel, 24 anos:

"Na verdade, é mais pânico de escadão do que acontecido de fato. Pelo menos aqui, nesse escadão da Martinho Prado, sempre tem uns noias perdidos por aí. Ali embaixo do viaduto, tinha um vão que era uma academia de boxe, que agora eles demoliram e tem outra escada ali, com uns grafites legais, que é o ponto preferido do Kassab de limpar mendigo, sempre tem alguém lavando. Aqui é do lado de casa, não pego escadão porque não sei lidar, não dou conta… No escadão da Caio Prado, ali onde o vento faz a curva e a Frei Caneca surge, dois jovens meliantes me abordaram, pediram celular e grana. Acabaram recusando o celular (porque "essa porra não tira foto") e me levaram três ou quatro reais. Escadão de interior é um pouco diferente, é onde você bebe a noite inteira. Bebia bastante em escadões. Dava uns pegas, mas não trepava, geralmente era escadão da igreja e vinha aquela culpa católica (RISOS)."

Exibição pública ou curtição

Mayara, 32 anos:

"Eu tinha um ex-caso e ele comprou uma câmera nova e queria testar essa câmera. Fomos jantar num restaurante nordestino e na volta, indo pra casa, passamos num escadão que é na Cardeal, e ele disse "meu, vamos descer para tirar umas fotos?" e eu, "vamos". E ele estava bêbado e começou "tira aqui", "sobe um pouco o vestido", "abaixa um pouco a calcinha", "agora vai naquele canto", "vira a bunda pra cá", sabe essas coisas? E acabei ficando pelada no escadão, morrendo de medo de aparecer alguém. Foi uma adrenalina, ai meu Deus, que que eu tô fazendo. Adrenalina pura."

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- Vocês treparam no escadão?

"Não. Porque não dava tempo (RISOS)."

Trampas ou taxa de conversão

Flávia, 32 anos:

"Eu estava indo para a casa de um amigo, descendo a Nove de Julho. Parei num ponto de ônibus e subi o escadão mais próximo da casa dele, e aí, quando estava subindo, veio descendo um cara bem alto e me abordou. Pediu minha mochila, queria que eu sentasse na escada. Eu não queria dar minha mochila porque tinha toda minha vida dentro, e fui pegando dinheiro. Tinha quinze reais na carteira, dei pra ele, dei meu celular velho e fui subindo a escada. Fui embora correndo. Ele estava desesperado, mas acho que deu pra ele comprar pedra na boca ali no Bixiga… A minha relação com esses escadões de São Paulo é uma rota de fuga, porque sempre há possibilidade de assalto… e de mijo. Não é lugar de se ficar, é sempre um lugar de passar correndo. Apesar de ter passado muitas vezes por escadões, eu fui assaltada uma só vez, então, até que a taxa de conversão está boa."