Esta matéria foi originalmente publicada na VICE US .
A subcultura cholo é controversa. Mesmo entre descendentes de mexicanos nascidos nos EUA, a estética de rua, que nasceu na comunidade Chicanx do leste de Los Angeles, pode ser ridicularizada por sua resistência à assimilação norte-americana e sua afiliação branda com gangues. Mas para o estilista Willy Chavarria, o espírito cholo está em tudo. A marca que leva seu próprio nome abraça o estilo único que Chavarria viu crescendo na Califórnia nos anos 80 e 90, pegando o visual dos Chicanxs que cruzavam as ruas de LA em lowriders e o transportando para as passarelas da Semana de Moda de Nova York.
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Tradicionalmente, o look cholo é tipificado por peças básicas de trabalho, como camisas abotoadas até em cima e calças Dickies tamanho grande. As calças cáqui em particular são usadas com cintos bem presos na cintura, criando pregas. A parte de trás das calças muitas vezes são presas com alfinetes para não arrastar no chão. Hoje, a interpretação de Chavarria desse estilo vem do jeans e da lã, com cinturas tamanho grande dobradas e costurada para criar o mesmo efeito.
“Amo o fato [do cholo] ter uma identidade distinta”, me disse o estilista mexicano nascido nos EUA na loja de sua marca no SoHo, Manhattan. “Era uma questão de pegar essas roupas que não eram da alta-costura e as tornar de alta-costura. Sempre apreciei isso.” Você vê essa abordagem em tudo que ele faz, como os cintos longos da colaboração recente da marca com a Brandblack, que parecem um acessório herdado de um irmão mais velho.
Nascido em San Joaquin Valley, na Califórnia, como filho único de pai mexicano e mãe irlandesa-americana, arte não era uma coisa tida em alta estima na casa de Chavarria. “Vindo de uma família de imigrantes, o principal objetivo era colocar comida na mesa”, disse o estilista de 49 anos. “Arte não era algo que você pensava para ganhar dinheiro, então eu era desencorajado a desenhar ou fazer qualquer coisa do tipo.”
Mesmo não tendo trabalhado colhendo alface como muitos de seus amigos, aos 12 anos Chavarria já estava lavando pratos em restaurantes locais, ganhando seu próprio dinheiro. Apesar da ênfase no trabalho tradicional em sua comunidade, ele sempre nutriu seu lado artístico. Aos cinco anos, ele já desenhava em agendas de telefone. Mais tarde, ele colecionava revistas de moda, escrevia poesia e explorava o design gráfico.
O ambiente em que cresceu também o tornou muito consciente de raça. Em sua cidade natal “havia muita segregação entre brancos e morenos”, explicou ele. Mesmo em sua própria família; ele lembra que a mãe branca foi afastada da família dela depois de casar com um mexicano. “Na parte branca da cidade [antes de eu nascer], eles tinham um cartaz dizendo ‘Se você é moreno, não fique na rua depois de escurecer’”.
Essas experiências, junto com a política seminal da cena cholo, injetaram um senso de propósito em Chavarria. “Decidi bem jovem que tudo que eu fizesse teria conotação política”, ele explicou. “Eu queria sempre dar voz às pessoas oprimidas.”
Para um cara que começou na moda mais tarde que a maioria — “Saí dos trilhos por um tempo”, explicou com uma risada —, Chavarria tem um currículo e tanto. Ele começou na Joe Boxer no meio dos anos 80, enquanto estudava design gráfico na Academy of Art em São Francisco. Começando no departamento de envios, ele acabou desenhando ao lado de Nick Graham, o fundador da empresa. Esse trabalho se formalizou na Voler, onde Chavarria desenhava peças de ciclismo, depois se envolvendo na terceirização da linha RLX da Ralph Lauren de roupas esportivas. O estilista se deu tão bem nesse trabalho que a empresa o contratou, fazendo com que ele se mudasse da Califórnia para Nova York.
Chavarria fez cinco anos do que a indústria chama de “Ralph Lauren University“, abordando cada aspecto do design. “Quando me demiti, meu chefe ficou furioso”, conta Chavarria. “Ele me disse: ‘Isso aqui não é um treinamento para você aprender o ofício e depois trabalhar em outro lugar.’” Só que, de certa maneira, era sim. As paredes da Lauren University criaram uma geração de estilistas de moda masculina, incluindo pesos-pesados como Joseph Abboud, Thom Browne, John Varvatos e Todd Snyder.
“Eu estava indo muito bem lá. Havia muito orçamento para colocar no design”, contou Chavarria sobre a experiência. Hoje a Ralph Lauren não vai tão bem, tendo perdido US$ 204 milhões no quarto trimestre e fechando sua loja na Quinta Avenida em abril. “Passávamos o tempo todo desenhando, nos certificando de que tudo estava perfeito. Passávamos semanas aperfeiçoando conceitos para uma apresentação de apenas uma hora para Ralph. Por essa chance, sou muito grato.”
Em outubro de 2010, com o sócio David Ramirez, ele abriu a Palmer Trading Company, uma loja física vendendo moda masculina, móveis e acessórios vintage. “Era basicamente o que eu tinha aprendido na Ralph”, disse Chavarria sobre loja que comandava enquanto tinha uma posição como estilista na American Eagle. “Sendo honesto, eu não era totalmente apaixonado por esse projeto porque essa não era uma criação 100% minha.” Mas isso acabou o colocando na posição de lançar sua própria marca.
Com o tempo, entre as peças vintage, Chavarria começou uma marca própria para a Palmer Tranding Company. Era principalmente uma marca de roupas de trabalho, feitas nos EUA. A marca estava indo bem, conseguindo diversas colaborações e uma parceria com a Dickies que acaba esta temporada.
“Nosso showroom no Japão estava vendo o que estávamos fazendo, e pediram que fizéssemos mais daquilo, então decidimos criar a marca Willy”, explicou Chavarria. No outono de 2015, sua temporada de estreia, a marca só era vendida no Japão como uma linha mais fashion. Mas a demanda cresceu tanto que eles lançaram uma linha nos EUA na temporada seguinte, que acabou revendida por lojas como Opening Ceremony e Barneys. Então Willy decidiu investir tudo, e rebatizou a Palmer Tranding Company como Willy Chavarria.
Desde o começo, a marca de Chavarria é uma plataforma de expressão política. Mas a apresentação de estreia da marca na NYFW em fevereiro provavelmente foi a mais bombástica. Escolhido pessoalmente pelo CFDA como parte da semana, o desfile inaugural de Willy Chavarria fez um comentário sobre a eleição de Donald Trump e o clima político atual nos EUA.
“Quando estava desenhando essa coleção, eu sabia que ela tinha esse elemento de resistência à opressão”, explicou Chavarria. “Durante o ano, as coisas foram ficando cada vez mais feias… Eu queria mostrar o poder, a dignidade e a elegância das pessoas que são oprimidas.”
Antes do desfile, Chavarria fez um chamado de elenco no Instagram de sua marca. Os anúncios pediam “sexy wet backs” [uma gíria para imigrantes mexicanos], “imigrantes morenos” e “negros e orgulhosos“. Para o estilista, era uma questão de se apropriar desses termos e recontextualizá-los em algo positivo. A conexão entre eles era “intolerância ao ódio”.
“Eu queria que as pessoas reagissem a essas propagandas e quisessem se envolver”, disse Chavarria. Para todos os projetos da marca, Chavarria geralmente escolhe modelos nas ruas, enfatizando aqueles que normalmente ficam de fora das definições estreitas de beleza. “Eu queria que o desfile fosse emotivo, e trazer para o projeto pessoas que estavam nesses extremos.”
Em primeiro lugar, o desfile foi coreografado por Marlon Taylor-Wiles, com modelos dentro de uma cerca, evocando a ideia das detenções de imigrantes. O timing da escolha foi muito apropriado, considerando a proposta de proibição de viagens de Trump. A trilha sonora do desfile contava com as vozes distorcidas de Cesar Chavez, Martin Luther King Jr. e RuPaul.
“Há uma positividade no que fazemos de que estou sempre consciente”, me disse Chavarria quando perguntei quais foram as repercussões do desfile. “Mesmo quando estávamos pensando no desfile, queríamos que a marca fizesse uma declaração, mas também deixasse as pessoas se sentindo bem. Não queremos que as pessoas se sintam mal ou excluídas.” O estilista continuou dizendo que além da dissolução de uma parceria antiga, a marca não teve mais respostas negativas depois da declaração política no desfile.
Para a primavera de 2018, Chavarria planeja colaborar com o artista Brian Calvin, seu amigo de infância de Visalia, uma cidade de San Joaquin Valley na Califórnia. Calvin é um pintor figurativo contemporâneo, cujas cores fortes abordam a juventude. O projeto vai apresentar o trabalho de Calvin e focar na beleza emergindo da opressão, ainda com uma base de inspiração cholo. “O look cholo é onipresente no nosso design”, me explicou Chavarria. “Cresci com isso. Mas esse estilo está em tudo, ele cruza muitos territórios, mesmo a cultura do skate já tomou esse visual.”
Agora Chavarria pretende tomar o estilo de volta.
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Todas as fotos de Willy por Meron Menghistab. Siga o cara no Instagram .
Tradução: Marina Schnoor