Fui assistir quarentões adolescentes tentando amadurecer em ‘T2: Trainspotting’

Tudo começou há 20 anos. Na época eu tinha três anos de vida, mas isso não me impediu, 10 anos depois, de me tornar uma grande fã do filme. Trainspotting, baseado no livro de Irvine Welsh, conta a história de quatro amigos, ou melhor, de uma oportunidade seguida de uma traição — como o próprio Spud define. Os personagens vividos por Ewan McGregor, Robert Carlyle, Ewen Bremner e Jonny Lee Miller influenciaram minha adolescência. Não que eu saísse por aí roubando pessoas em troca de heroína, mas a famosa cena inicial narrada por Renton, “Choose life”, definia minha forma de encarar a vida naquela época. Isso e o uso irresponsável de sintéticos.

Então, quando assisti ao novo filme da série — que estreia quinta-feira (23) nos cinemas brasileiros — senti um grande mix de sentimentos. Como subir numa montanha-russa de segurança duvidosa, em que a cada descida você sente sua alma se distanciando do seu corpo. Eu estava anestesiada pela ideia de rever meus personagens queridos, mas tomada por um medo profundo de ser uma perda de tempo. O engraçado é que não cheguei à uma conclusão ainda. A história de 1996 retratou um lado obscuro da juventude, consumida por uma desilusão contagiosa diante de um crescente consumismo e ociosa por uma identidade. Acredito que todas as gerações têm seus representantes insatisfeitos, ansiosos por mudar o futuro e a filosofia até então adotada, e no caso de nossos protagonistas, o ato de rebeldia era a renúncia pela escolha de viver. Eles abraçavam a heroína como se fosse a única opção — e era mesmo, na cabeça deles.

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Encontrar esses quatro homens em T2, filme também dirigido por Danny Boyle, me fez mergulhar em possibilidades. O que estariam fazendo? Como crescer e amadurecer a partir de uma história como aquela? Mas o que eu entendi, quando saí da sala de cinema, foi que de forma alguma T2: Trainspotting busca responder essas perguntas. Na verdade, o filme faz questão de repetir a mesma receita, só que de maneira tosca, provando que a desilusão e a falta de perspectiva ainda permeia a vida deles. Mesmo que a heroína, antiga protagonista, tenha sido substituída por outros vícios — como cocaína e exercício físico. Os quatro estão juntos novamente: Renton volta para Edimburgo quando percebe que a vida em Amsterdã está prestes a desmoronar e Begbie foge da prisão; Sick Boy vive um relacionamento pouco convencional e Spud está no limite, preso dentro de um ciclo que o leva de volta ao conforto do antigo vício.

Spud em ‘T2’. Foto: Divulgação

Ainda assim, a dinâmica entre eles é muito diferente e é até um pouco constrangedor identificar certos comportamentos, tão infantis, em homens de 40 e poucos anos. Aquele charme junkie que fazia eu me sentir atraída — Sick Boy era minha grande paixão — perdeu todo o encanto. E, vendo o novo filme, eu não conseguia sentir nada além de pena. Antes as cores, os ângulos, tinham um impacto muito forte e traduziam os efeitos causados pela droga e o estado emocional das personagens. E a verdade é que o filme adquiriu um tom hollywoodiano estranho e a história precisou ser sustentada por cenas do antigo filme diversas vezes.

Recuperados? Foto: Divulgação

De qualquer forma, não vou negar que me abracei emocionada em algumas partes. Quando Renton volta à casa de seus pais e senta na mesa de jantar, sua sombra projeta-se na parede, substituindo a presença da falecida mãe. Esse tipo de referência ao antigo filme me parece mais interessante e poderia ter sido suficiente. Mas, claro, tratando-se de uma história de 20 anos atrás, o filme não foi feito apenas para mim — uma fã saudosista esperançosa —, mas também para a nova geração. E a personagem Veronika, namorada de Sick Boy, representa esse novo espectador. Sua presença é a desculpa perfeita para todas as explicações, histórias e flashbacks, que, no final das contas, te dão a sensação de estar assistindo ao primeiro filme novamente, só que reeditado.

É, relendo minha análise, acho que cheguei à uma conclusão. Fico com o primeiro filme mesmo, com os personagens magrelos, pálidos, perdidos, jovens. Mas não posso dizer que é uma total perda de tempo. Acho que você vai ter que assistir e tirar sua própria conclusão (principalmente se tiver 18 anos e nem souber do que eu estou falando)!


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